A alma do homem e da política, segundo Zaratustra

A alma do homem, como o universo, era representada como o campo de batalha dos espíritos benéficos e maléficos; cada homem era um guerreiro, gostasse ele ou não, no exército ou do Senhor ou do Diabo; cada ato ou omissão apoiava a causa de Ahura-Mazda ou de Ahriman. Era uma ética ainda mais admirável do que a teologia – se o homem precisa ter apoios sobrenaturais para sua moralidade; ele [o zoroastrismo] dava à vida comum uma dignidade e uma significância maiores do qualquer uma que poderia advir de uma visão de mundo que via o homem (na expressão medieval) como um verme miserável ou (nos tempos modernos) como um autômato mecânico.

Trecho retirado do livro “Our Oriental Heritage”, do historiador e filósofo americano Will Durant (1885-1981) explicando a religião fundada por Zaratustra, profeta persa do século VII a.C.

Se tudo fosse tão simples! Quem dera que houvesse pessoas más em algum lugar cometendo atos malévolos insidiosamente, e fosse necessário apenas separá-las do resto de nós e destruí-las. Mas a linha que divide o bem do mal passa pelo coração de cada ser humano. E quem está disposto a destruir uma parte do seu próprio coração?

Trecho retirado do Arquipélago Gulag do escritor russo Aleksander Solzhenitsyn (1918-2008)

 

    Prezados leitores, na semana passada foi meu humilde intento mostrar como há muitos elementos religiosos no movimento ambientalista, no sentido de considerar que aquecimento climático é uma punição da Natureza pelos pecados do homem que só será resolvido quando este corrigir seu comportamento e praticar a virtude ambiental. Citando Konstantin Sakkas, filósofo e historiador, quis apontar que o tempo da Terra e o tempo do Homo Sapiens são totalmente diferentes, pois um se mede em bilhões de anos e o outro em milhares de anos. Assim, nossa capacidade de influenciar para o bem ou para o mal a vida na Terra é infinitesimal e a continuidade ou o perecimento dela acontecerão independentemente dos esforços de redenção do nosso comportamento pecador. Nesta semana, meu objetivo é enfocar um outro elemento religioso presente em nós, indivíduos do século XXI que temos como uma das principais características não mais partilharmos uma religião como outrora era praxe no mundo ocidental. Falo dessa luta entre o bem e o mal, a qual foi exemplificada na teologia do zoroastrismo, conforme explica Will Durant em seu livro ao falar sobre a Pérsia.

    Não se sabe se Zaratustra realmente existiu ou não, mas o fato é que ele cultuava o Senhor da Luz, Ahura-Mazda, que ao final dos tempos derrotaria Ahriman, o Príncipe das Trevas. Como lhe é típico Durant, analisa os pontos positivos e negativos do zoroastrismo. Comparando-o com o Cristianismo medieval e com a modernidade ocidental pós-cristã, ele vê nele, conforme o trecho que abre este artigo, uma grande qualidade: a de dar um sentido à vida do homem e não só isso, mas um sentido heroico, pois cada indivíduo é um soldado nas hostes do exército da luz ou das trevas, e cabe a cada um, dotado de livre arbítrio, escolher em qual vai se alistar.

    É preciso ter em mente que na Idade Média o homem era considerado um mísero pecador e que na época em que Will Durant escreveu seu livro, na década de 1930, a visão materialista predominava, segundo a qual o homem era uma partícula de matéria que se relacionava com outras, mas que não tinha sentido transcendente nenhum, pois tais relações eram contingentes. Assim, não admira que para o historiador e filósofo americano ver-se como participante de uma luta entre duas forças antagônicas era algo mais digno, na medida em que colocava a existência individual no epicentro de um drama e não como um fenômeno aleatório e desconectado do grande esquema das coisas. Na teologia do zoroastrismo o homem existia para desempenhar um papel definido que determinaria o sentido último do universo.

    Implicitamente, Durant aponta a grande falha da civilização ocidental tal como ela se apresentava na primeira metade do século XX, qual seja, se reduzirmos o homem à sua vida física, o que resta para ele em termos de ideias, de motivação de vida, de dignidade intrínseca, de sentido de pertencimento a algo maior do que ele? Tal ceticismo está a um passo da desintegração social, pois torna mais difícil que o homem forme laços com o passado e o futuro se ele vive eternamente na materialidade do presente.

    Segundo a descrição de Durant, o zoroastrismo chegou a ser a religião oficial do império persa sob Dario I (550 a.C. – 486 a.C.), mas sua ênfase em um deus único, Ahura-Mazda, ia contra a tradição politeísta do povo que cultuava entre outros o Deus do Sol, Mithra e a Deusa da Lua, Anaita. Depois da morte de Zaratustra, os antigos sacerdotes, chamados de Magos, reassumiram o controle de maneira sutil, incorporando o profeta da nova religião às suas práticas de cura, adivinhação, repetição de fórmulas mágicas e feitiçaria, fazendo na prática com que o combate de Zaratustra à idolatria e à superstição virasse letra morta. De qualquer forma, por mais que a influência histórica do zoroastrismo tenha sido de pouca importância e seus preceitos tenham sido logo esquecidos, ele ainda sobrevive hoje cultuado pelos parses na Índia e no Irã, principalmente em Teerã, Iázide e Carmânia.

    Diferente da visão da luta das forças do bem e do mal, Aleksander Solzhenitsyn, conforme o trecho que abre este artigo, tirado do seu relato sobre sua experiência nos campos de trabalhos forçados do stalinismo, considera que o bem e o mal se digladiam no coração de cada homem, em cada ato que o homem pratica. Não basta apenas que cada indivíduo faça uma única e definitiva escolha de que lado estará na refrega moral. Em cada passo que o homem dá, em cada decisão que toma sobre que rumo tomar, o homem confronta-se com a luta entre seus bons e maus instintos e o desenlace nunca é previsível, pois as circunstâncias mudam, os desejos e paixões são diferentes de um momento para o outro.

    Prezados leitores, quem poderá negar que a visão escatológica do zoroastrismo não influencia nossa cultura ainda que nem saibamos a origem histórica dela? A luta entre heróis e vilões em séries e filmes, as disputas entre figuras políticas polêmicas que tem seus seguidores e seus detratores, ambos ferozes na defesa e no ataque? Pois em 2022, não teremos no Brasil a luta entre o bem e o mal, representados por Lula e por Bolsonaro, a depender da opinião política de cada um?

    Por outro lado, uma pitada de Solzhenitsyn não faria mal ao nosso debate político. Nem monstros nem santos, cada homem é santo num momento e monstro no outro, de forma que os rótulos, as estigmatizações, como “hostes bolsonaristas” e “hostes lulistas”, “negacionistas”, “tiozão do pavê”, “petelhos”, “terraplanistas”, “comunistas” que se preparam para se digladiar neste ano servem mais para confundir do que para explicar. Os epítetos colados a um ou outro grupo fazem da disputa política uma luta entre o bem e o mal que não serve para solucionar problemas pois não permite consensos nem denominadores comuns, apensa visa a derrota do inimigo. Oxalá que o povo brasileiro saia desse belicismo insuflado pela mídia e as pesquisas eleitorais incessantes e saiba perceber que o buraco é mais embaixo do que o nós versus eles.

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Pecado e virtude

Isaías e Amós iniciaram, em uma época militarista, a exaltação daquelas virtudes de simplicidade e gentileza, de cooperação e amizade, que Jesus tornaria um elemento crucial do seu credo. Foram eles que, quando a Bíblia foi impressa na Europa, incendiaram a mente dos alemães com um cristianismo rejuvenescido e iluminaram a tocha da Reforma Protestante; foram suas virtudes ferozes e intolerantes que formaram os puritanos. Sua filosofia moral foi baseada na teoria que requer melhor comprovação – a de que o homem justo irá prosperar, e o homem mal será destruído; mas mesmo que isso seja uma ilusão é a fraqueza de uma mente nobre.

Trecho retirado do livro “Nossa Herança Oriental”, do historiador e filósofo americano Will Durant (1885-1981)

 

Mas não devemos sucumbir à fantasia protestante secular da grandeza de que controlamos o sistema terrestre através de processos físicos desencadeados por nós e que podemos  ou devemos agora, generosamente, parar de fazê-lo. É normal que os seres vivos intervenham na natureza, mas é improvável que a própria natureza possa ser extinta. A própria natureza, a Mãe Terra, tão doce e tão-pseudo gentilmente invocada pelo movimento climático, cuidará de uma correção; nossa existência continuada como espécie animal está em suas mãos mais do que em nossas. Mas “culpa” e “apocalipse” não são categorias da história natural.

Trecho de artigo de Konstantin Sakkas, filósofo e historiador, intitulado Apocalipse Agora, publicado em 31 de dezembro de 2021

    Prezados leitores, na semana passada eu chamei a atenção para a comparação que Will Durant faz entre o método assírio de escolher seus governantes, assassinando os antigos e os substituindo pelos seus carrascos, e o método americano de escolher os governantes, por meio de eleições em que o poder corruptor do dinheiro determina em grande parte quem será o escolhido. Cada um deles tem suas vantagens e desvantagens, mas o fato é que o conhecimento do percurso histórico das civilizações oferecido por um livro como o de Durant permite-nos perceber a real dimensão dos nossos valores relativizando-os, e ao mesmo tempo perceber como eles são universais, isto é, como as nossas opções sobre a organização da sociedade e suas leis já foram tentadas em outras épocas e em outros lugares em que se enfrentaram os mesmos dilemas que nós enfrentamos.

    Pois se a violência política tem a vantagem de resolver de maneira rápida uma situação, permitindo que haja uma escolha clara por determinado caminho, os compromissos que a democracia representativa requer para que não haja violência e todos participarem do processo pode levar a um descrédito do processo pela corrupção que está geralmente associada às trocas de favores necessárias aos compromissos. Violência e eficácia, seguindo a prática dos assírios ou paz e tergiversação, seguindo a prática dos modernos ocidentais? Nesta semana, meu foco será nas comparações que Durant faz das práticas religiosas ao longo da história das civilizações e como isso pode lançar luz sobre nossas próprias escolhas no século XXI.

    Como mostra o trecho que abre este artigo, Will Durant nos fornece um retrato da religião judaica descrevendo as ideias de dois dos maiores profetas do Antigo Testamento, Amós, que morreu em 745 a.C., no reino de Judá, e Isaías (de 765 a.C. a 681 a.C.). A Palestina era então dividida, depois do reinado do rei Salomão (que teria durado de 966 a.C. a 926 a.C.), em dois reinos, o reino do norte, Israel, cuja capital era Samaria, e o reino do sul, Judá, cuja capital era Jerusalém. As disputas entre as várias tribos levam ao enfraquecimento da Palestina, que tem que enfrentar vários inimigos sucessivamente, os babilônios, os assírios, os egípcios e os persas e é nesse clima de incertezas e debilidade que Amós e Isaías apresentam ideias religiosas radicais.

    Para que o país pudesse ser unificado e pudesse fazer frente aos que tentavam destruí-lo, era preciso que a religião deixasse de ser uma prática ritualística de oferecimento de sacrifícios e de orações e se tornasse uma prática de virtudes, isto é, menos cobiça e avareza, menos crueldade com os fracos e menos opressão dos pobres com impostos, confiscos e trabalhos forçados. Só se os homens fossem justos em seus atos cotidianos é que Deus ficaria satisfeito, pois os rituais só serviam para enriquecer mercadores e sacerdotes. Se Deus ficasse feliz com o bom comportamento dos homens ELE os beneficiaria com paz e prosperidade. Se ele ficasse descontente com a insistência nos pecados, Deus castigaria os homens por não terem ouvido suas admoestações contra a soberba, a avareza, a inveja, a ira, a luxúria, a gula e a preguiça e lhes infligiria fome, escravidão, peste, exílio como justa paga das falhas morais.

    Pecado, mudança de comportamento, castigo pela incapacidade de mudar. Durant descreve como essa mudança de ênfase da religião em prol do conceito abstrato de justiça representa um passo à frente para indivíduos que rezavam e faziam sacrifícios para seus deuses para conquistar o favor das divindades e assim conseguir derrotar seus inimigos. Esse fervor dos profetas pela prática virtuosa acima de tudo foi retomado pelo Cristianismo e depois de séculos de institucionalização da Igreja Católica, que acabara se transformando em uma instituição muito mais política do que religiosa, pelos Protestantes. Estes denunciaram a corrupção moral dos membros da Igreja, focados que estavam no poder em detrimento do amor, da fé, da caridade e da esperança pregados por Jesus Cristo e pregaram a primazia da consciência individua na relação direta com Deus independentemente de intermediários que cobravam um alto preço pelos serviços.

    É neste ponto que extrapolo as comparações de Durant entre o fervor dos profetas do antigo Testamento e o fervor dos Protestantes e Puritanos para abordar o fervor dos arautos do apocalipse climático em pleno século XXI. O esquema de pensamento é o mesmo: o homem pecou ao explorar a Terra em demasia, ao submetê-la aos seus caprichos e as suas necessidades, em detrimento dos outros seres vivos. Se o homem continuar a pecar, o resultado será a mudança climática irreversível: o aquecimento da Terra e a inviabilização da vida como a conhecemos atualmente. A solução é o Homem emendar-se moralmente e agir de maneira ética para com a Natureza, restabelecendo o equilíbrio perdido.

    Conforme mostra Konstantin Sakkas em seu artigo, cujo trecho é transcrito acima e em que ele faz um breve percurso sobre os eventos cataclísmicos que moldaram a história da Terra ao longo de milhões de anos, a atividade do homem sem dúvida tem influência sobre a vida das plantas e dos animais. No entanto, isso não é suficiente para que pretendamos ter uma importância fundamental na história da vida da Terra de forma que possamos escolher preservá-la ou destruí-la. Nosso sentimento de culpa ou falta dele é irrelevante em face dos bilhões de anos do planeta azul, dos vários períodos de glaciação e de aquecimento já ocorridos muito antes que o Homo Sapiens estivesse no planeta, do tempo ínfimo em que nós atuamos em face da imensidão da história natural e das extinções em massa de seres vivos causadas por essa alternância de períodos. Em suma, sobrestimamos tanto nossa capacidade de destruir a natureza quanto nossa capacidade de regenerá-la por uma escolha do que é certo, porque ela tem seus próprios ritmos e complexidades, ditados por bilhões de anos de transformações.

    Em suma, esse fervor moralista de redenção dos pecados pela prática da virtude, que desde os grandes profetas do Antigo Testamento até a Reforma Protestante focava nas relações dos homens entre si, e de como elas poderiam ser melhoradas em prol da justiça, paz e harmonia, na era pós-cristã da civilização ocidental ficou como resquício da religião perdida transposto para as relações do Homem com a Natureza. O equilíbrio será restaurado quando os seres humanos passarem a ter um comportamento eticamente responsável com o meio ambiente e a Mãe Terra nos recompensará com bonança duradoura. No entanto, à luz da história da vida na Terra, será que Gaia se importa com nosso destino como o Deus da Bíblia se importa com o povo que o escolheu como a única divindade? Essa é a dúvida plantada pela descrição objetiva de Sakkas sobre a história do nosso planeta.

    O sangue da violência ou dinheiro da corrupção no campo da política, o pecado ou a virtude no campo religioso: conforme ensina Durant em sua História das Civilizações, os dilemas enfrentados ao longo das épocas tendem a repetir-se adaptando-se às circunstâncias de lugar e de tempo, mas sempre nos obrigando, enquanto seres sociais, a fazermos nossa opção coletiva em prol de como queremos organizar nossas relações mútuas. Mas não envolvamos Gaia: ela não tem nada a ver com nossas escolhas morais.

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Entre o sangue e as moedas

A fraqueza das monarquias orientais estava relacionada ao seu vício na violência. Não somente as províncias assujeitadas revoltavam-se frequentemente, mas dentro do próprio palácio ou família real a violência vira e mexe tentava destruir o que a violência havia estabelecido e mantido. As nações do Oriente Próximo preferiam revoltas violentas a eleições corruptas, e sua forma de livrar-se de governantes indesejáveis era o assassinato.

Trecho retirado do livro “Nossa Herança Oriental”, do historiador e filósofo americano Will Durant (1885-1981)

A mais medíocre democracia é preferível à mais perfeita ditadura, seja ela encabeçada por Pinochet ou Fidel Castro. Esta é minha bandeira e por isso defendo as imperfeitas democracias contra todas as ditaduras, sem exceção. […]Agora, o Chile acaba de celebrar eleições e, para mim, não há dúvida que, no momento presente, a maioria dos eleitores chilenos cometeu um grave equívoco.

Trecho retirado do artigo “Os ditadores e o erro do Chile”, do escritor peruano Mario Vargas Llosa

O Chile caiu e só resta o Brasil

Título da última live do ano de Rodrigo Constantino, economista e jornalista de direita brasileiro que mora nos Estados Unidos

    Prezados leitores, em sua descrição das civilizações que floresceram nas regiões que são atualmente conhecidas como a Ásia Menor e o Oriente Médio, Will Durant chama a atenção para o fato de que na conquista de um reino por outro, a destruição das obras arquitetônicas e artísticas, a profanação dos templos religiosos, a escravização e o assassinato de populações inteiras eram a regra. Babilônios, assírios, hititas, armênios, frígios, lídios, árabes, fenícios, sírios e judeus, ameaçados em suas fronteiras por povos nômades, recorriam ao derramamento do sangue dos inimigos como forma de vingar-se de injúrias passadas e de garantir a sobrevivência das suas próprias sociedades. As páginas de “Nossa Herança Oriental” estão recheadas de descrições do que era feito quando a batalha era ganha: pessoas eram queimadas vivas, incluindo crianças, ou eram escalpeladas ou tinham os olhos arrancados.

    Como é característico de um autor que, ao contar a história das diferentes civilizações, procura tirar lições sobre os pontos positivos e negativos de cada uma delas e fazer comparações com a própria civilização da qual ele fazia parte, o trecho que abre este humilde artigo contém uma nota irônica em relação ao modus operandi das monarquias orientais: eles preferiam a ruptura radical com o status quo, por meio do aniquilamento físico da sociedade anterior, incluindo seus recursos humanos, econômicos e artísticos, ao invés da escolha dos governantes por meio de eleições corruptas, influenciadas pelo dinheiro dos mais ricos, como era a praxe na democracia americana da década de 1930, época em que Durant lançou seu livro. A ironia contida na comparação entre o sangue derramado pelos déspotas orientais e o dinheiro distribuído pelos poderosos para eleger aqueles que serviriam seus interesses no regime democrático realça um problema enfrentado no Ocidente em pleno século XXI: a decepção dos eleitores com o sistema político e a rejeição à participação no processo, fenômeno exemplificado nas recentes eleições presidenciais no Chile, vencidas por Gabriel Boric contra José Antonio Kast. Em que pese o candidato da esquerda ter obtido no segundo turno 8,3 milhões de votos, um recorde no país, o fato é que no primeiro turno houve uma abstenção de 53%.

    Tais resultados mostram que todos os eleitores estão descontentes: a maioria não teve interesse em votar num primeiro momento e só o fez no último round da disputa para livrar-se de um candidato que muitos chilenos consideravam seria um desastre, no caso o advogado de 55 anos que era contra a imigração, contra o aborto e contra o casamento gay. O voto de 55,9% dos eleitores que compareceram às urnas em Boric não foi porque acreditavam particularmente em um deputado de 35 anos que ganhou proeminência ao liderar os protestos de 2019 em prol de uma ampliação dos direitos sociais, particularmente da educação, da saúde e da previdência. Afinal, se assim fosse, eles já teriam comparecido já no primeiro turno.

    Será que esse desinteresse se deve ao fato sugerido por Durant a respeito dos Estados Unidos de que o método de seleção por meio de eleições não escolhe os que representarão de fato os interesses do povo, mas os que recebem dinheiro para defender pautas particulares? Caso seja essa a percepção dos eleitores, qual será o efeito desse desencanto generalizado com a corrupção? Jogaremos a democracia pela janela e optaremos por soluções mais rápidas ou permaneceremos com ela a despeito dos seus defeitos, porque não há nada melhor?

    Há diferentes perspectivas a esse respeito. Mário Vargas Llosa, como bom liberal que é, faz uma opção radical pela democracia. Em seu artigo, citado acima, ele declara considerar um erro os chilenos elegerem uma pessoa sem experiência que pode fazer desandar a receita de sucesso econômico do Chile.  No entanto, o povo tem direito de errar e se Boric cometer erros o mesmo povo que o elegeu livrar-se-á dele nas próximas eleições, sem violência e sem traumas. Já expoentes da direita no Brasil, como Rodrigo Constantino, tem uma visão menos otimista do processo democrático na América Latina.

    Na sua live natalina, o jornalista e economista radicado nos Estados Unidos desde a reeleição de Dilma Rousseff em 2014, manifesta a opinião de que a desigualdade social e as características culturais do povo fazem com que a democracia ofereça surpresas desagradáveis aqui em nossas terras, fazendo com que esquerdistas que têm como foco fazer justiça social transferindo renda dos que produzem para os que não produzem sejam eleitos, impedindo o desenvolvimento saudável do capitalismo. Ele é categórico em dizer que o Chile vai certamente piorar, em que pese vislumbrar a possibilidade de que não seja tão ruim quanto se pode supor pelo perfil esquerdista de Gustavo Boric. Tanto assim que Constantino recomenda aos chilenos de terem um plano B de emigrar se a vida sob Boric tornar-se insuportável pelo peso da sanha redistributiva.

    Qual a saída para que a democracia permaneça como o regime vigente em países com grandes disparidades sociais e econômicas como ocorre na América Latina? Que os candidatos de esquerda ou direita esqueçam os ideais que inspiram seus eleitores a votar neles e quando se elejam governem de maneira a contemporizar com os diferentes interesses ou favorecer os interesses dos que têm influência econômica para manter o status quo? Ou as polarizações ideológicas serão cada vez mais intensas de modo que o homem da esquerda ou da direita eleito que trair sua base eleitoral será deposto violentamente como vingança tanto pelo grupo antagônico quanto pelo grupo de fiéis decepcionados com sua atuação?

    Enfim, o dilema colocado por Durant na sua caracterização das engrenagens do poder na Ásia Menor e no Oriente Médio há três mil anos repete-se agora. A opção entre a ditadura e a democracia, entre o sangue da violência e as moedas que lubrificam o sistema de troca de favores que caracterizam sistemas políticos como a democracia, em que a contemporização faz parte do jogo, está sempre colocada, seja como ameaça, seja como esperança. Quem acredita em determinados princípios sobre a organização da sociedade o toma lá dá cá democrático é asqueroso. Quem acredita mais na caminhada do que no fim dela, a democracia é cheia de percalços e moedas, mas este é o preço a pagar para que seu caminho não tenha uma gota de sangue.

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Entre a WIC e Nassau

“Nassau podia transplantar florestas e árvores frutíferas, mas não as benéficas instituições da sua própria pátria, que são coisas que têm suas raízes na história e nos hábitos e sentimentos daqueles a par de quem foram crescendo e a cujo crescimento se acomodaram.” Sua política não poderia triunfar nem sobre a cultura local, pois a “língua, a religião, os costumes, o caráter e o orgulho nacional dos portugueses eram outros tantos obstáculos, fortes em si mesmos e, na sua união, insuperáveis; nem sobre o caráter mercantil de uma conquista, em que o lucro da Companhia [era] o único fito, a estrela polar de toda a política”. Ao cabo dos seus anos de governo, Nassau já chegara a idêntica conclusão.

Trecho retirado do livro Nassau, escrito pelo historiador Evaldo Cabral de Mello

O endividamento luso-brasileiro avolumava-se desde 1640, pois, confiada na armada do conde da Torre, a gente da terra endividara-se pesadamente, comprando partidas de escravos e mercadorias a preço extorsivos, na expectativa de não ter de pagar. Houve, ademais, a frustração pela safra de 1641-2, além de que o suprimento das expedições contra Angola e o Maranhão havia esgotado os armazéns da Companhia.

Trecho retirado do livro Nassau, escrito pelo historiador Evaldo Cabral de Mello

    Prezados leitores, já tratei anteriormente neste meu humilde espaço das realizações de João Maurício de Nassau-Siegen (1604-1679) à frente do governo do Brasil holandês de 1637 a 1644 no que concerne à urbanização da Ilha de Antônio Vaz, com  a construção da Cidade Maurícia, a Mauritsdat, do Palácio de Vrijburg, a sede do seu governo que incluía parque, jardim botânico e zoológico e da Boa Vista, a casa de recreio; e à exploração científica e artística da flora e fauna brasileiras por aqueles que vieram na comitiva de Nassau, como Willem Piso, Frans Post e Albert Eckhout. Nesta semana, o foco será nas razões que levaram Nassau a ser convidado a se retirar do governo e o que isso revela sobre a colonização holandesa no Brasil, à luz do livro de Evaldo Cabral de Mello.

    Para entender tais razões, é preciso ter em mente que a conquista do Brasil foi um empreendimento da Companhia das Índias Ocidentais, conhecida pelo seu acrônimo na língua batava, WIC, que contrata Nassau para ser o governador, considerando sua experiência militar nos Países Baixos. No aspecto bélico Nassau não os decepcionou, pois o capitão e almirante-general do Brasil holandês expulsa os portugueses de Alagoas, conquista o forte português de São Jorge da Mina, ocupa o Ceará, repele o ataque da armada luso-espanhola, liderada pelo conde da Torre e enviada ao Brasil para restaurar o domínio lusitano no Nordeste, e rechaça o ataque terrestre desencadeado a partir da Bahia contra a colônia da WIC.

    Por outro lado, Nassau tinha uma visão administrativa de longo prazo que levou a desentendimentos com a WIC, cuja ótica era a de uma companhia que queria dar lucros aos seus acionistas. Considerando suas despesas com os funcionários atuando no Brasil, com as guarnições que mantinham o domínio da WIC e com as expedições militares, a WIC insistia em obter receitas de qualquer jeito, o que incluía cobrar dívidas de senhores de engenho os quais, conforme descreve o trecho acima, haviam tomado empréstimos para investir na produção e não tinham a mínima condição de pagamento, tendo em vista os baixos preços do açúcar no mercado internacional e as safras ruins.

    Se para a WIC o empreendimento colonial era uma operação contábil, para Nassau era preciso conquistar o coração e a mente dos luso-brasileiros para que eles não se revoltassem contra o domínio holandês. Isso requeria uma moratória das dívidas, sobre as quais incidiam juros de 3 a 4% ao mês, e o não confisco da propriedade, isto é, das instalações fabris e da escravaria, daqueles que estavam totalmente desprovidos de caixa para amortização dos juros e do principal. Além disso, Nassau considerava que a WIC deveria fazer mais investimentos em termos de suprimento de tropas que pudessem ser usadas para consolidar a conquista e rechaçar as ameaças dos luso-brasileiros contrários à presença batava que se concentravam na Bahia.

    Nenhum dos pedidos de Nassau foi atendido, pois a WIC pretendia realizar seus ativos brasileiros da melhor maneira possível para fazer caixa e dar uma satisfação àqueles que haviam investido na Companhia. O resultado foi que em 1643 Nassau é dispensado do governo do Brasil holandês. Em 1654, depois das duas batalhas de Guararapes em 1648 e 1649, nas quais os holandeses tentaram romper o sítio do Recife realizado pelas tropas de Fernandes Vieira, o que restava do Brasil Holandês capitulou. A perda da sua colônia nos trópicos foi um golpe mortal na WIC, que foi à falência em 1671.

    De certa maneira, a derrocada da WIC provou que Nassau estava certo. A visão mercantilista da empresa não era suficiente para manter a colônia e fazê-la prosperar, era preciso algo a mais que a direção da WIC não estava disposta a oferecer porque seu intuito não era  construir um Brasil holandês, mas basicamente vender escravos a preços altos aos colonos para compensar os investimentos na conquista pela Companhia dos entrepostos africanos e comprar açúcar a preços baixos para revendê-lo nos mercados europeus.

    E nesse sentido, Evaldo Cabral de Mello desmistifica a tese segundo a qual um Brasil holandês teria sido melhor do que um Brasil português, como acabamos sendo, depois dos 24 anos de presença batava no Nordeste do Brasil, desde a foz do Rio São Francisco até o Maranhão. Conforme o primeiro trecho que abre este artigo, as instituições que faziam a pujança dos Países Baixos no século XVII jamais foram transplantadas para o Brasil, a saber: seus órgãos republicanos de governo, como os Estados Gerais; sua monarquia não absolutista, em que a dinastia dos Orange, família da qual os stadtholder, que eram os chefes de Estado, originavam-se, e da qual Nassau fazia parte, não podia fazer o que bem entendesse, pois estava submetida ao controle dos Estados Gerais.

    E sabedor dessa discrepância entre o que era possível na Europa e o que era factível ao sul do Equador, Nassau, ao ser convidado a voltar ao Brasil como governador em 1647, faz exigências inaceitáveis para que fossem recusadas e ele não tivesse que simplesmente dizer a verdade aos dirigentes da WIC. De volta aos trópicos, Nassau encontraria os mesmos problemas que encontrou no seu primeiro período – as diferenças religiosas entre os luso-brasileiros católicos e os batavos calvinistas, a penúria econômica dos fazendeiros descapitalizados e acachapados por dívidas impagáveis – e estaria de mãos atadas da mesma maneira que em grande medida esteve de 1637 a 1644 pois teria que se submeter aos interesses da WIC de tratar o Brasil como uma vaca a ser ordenhada, não um país a ser organizado de acordo com a cultura, os hábitos e a moral do povo que o constituía.

    Prezados leitores, a sorte do Brasil Holandês, de efêmera duração, nos faz refletir sobre se de fato aprendemos, nesses trezentos e sessenta e sete anos que se passaram, a ter uma visão de longo prazo sobre o melhor caminho a trilhar para viabilizar um país e não simplesmente servir interesses contingentes de determinados grupos. O que tem predominado em nossa história? A opção pelo lucro rápido da WIC ou a estratégia nassoviana pela organização gradual de modo a obter a adesão do povo e assim consolidar o que foi construído? Pensem em todos os planos e projetos que já foram idealizados, executados em maior ou menor grau (planos econômicos de combate à inflação, políticas econômicas nacionalistas, programas habitacionais, obras faraônicas, CIEPS, CÉUS) e ao final acabaram sendo destruídos e vocês terão a resposta.

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Transações tropicais

Os problemas e as soluções do Brasil não estão nessas pautas puramente identitárias ou ideológicas. O que a gente precisa é tirar o debate desse campo. Quando Bolsonaro quiser levar para esse lado, não temos que gastar energia. Deixa ele falar. Bolsonaro é bom de polêmica e confusão, mas não de política pública.

Trecho da entrevista dada pelo prefeito de Recife, João Campos, ao jornal O Globo em 19 de dezembro

 

Muito estranha a conduta desta empresa. Ela está em recuperação judicial. Como é que a ANAC autoriza o funcionamento de uma empresa sem saúde financeira para fazer frente a seus compromissos? Isso tem que ser explicado […]. Estamos vendo aqui má-fé e irresponsabilidade.

Trecho da entrevista à rede Globo de Fernando Capez, diretor-executivo do Procon-SP, a respeito da Itapemirim Transportes Aéreos, que no dia 17 de dezembro cancelou todos os voos programados para este ano de 2021, num total de 480

Segundo Bolsonaro, o setor produtivo tem reclamado que as atuais leis tornam o Brasil “um país de direitos, mas que não tem emprego”. “Eles (empregadores) têm dito, não sou eu, ‘um pouquinho menos de direito e emprego’ ou ‘todos os direitos e menos emprego’

Trecho do artigo “Bolsonaro: Trabalhador terá de escolher entre mais direitos ou emprego”, publicado pelo jornal Valor Econômico em 4 de dezembro de 2018

    Prezados leitores, na semana passada introduzi-lhes o conceito de porta giratória para referir-me às relações nem sempre transparentes entre os órgãos reguladores e os setores econômicos regulados que fazem com que as normas que disciplinam as atividades econômicas naquele segmento e a própria aplicação delas acabam sendo fortemente influenciadas pelos agentes que atuam nas empresas, com consequências ruins para o consumidor, como exemplifiquei por meio da minha saga nas transações para resgate de um seguro. Nesta semana, tratarei do conceito de custos de transação.

    À luz da teoria econômica, os custos de transação são custos que não agregam valor para nenhuma das partes envolvidas e que não podem ser recuperados. Dividem-se em três: o custo da obtenção de informações relevantes e do contato com as partes com a qual a transação será celebrada; o custo da negociação das condições da transação que a tornem interessante para ambas as partes; e o custo incorrido para assegurar que a parte cumprirá as obrigações do contrato e que não se tornará inadimplente. Quanto maiores forem esses custos menor será a eficiência e menos valor é gerado. Dar-lhes-ei um exemplo concreto mencionando o caso da empresa Itapemirim que vendeu passagens aéreas para milhares de clientes e às vésperas dos feriados de fim de ano suspendeu as operações por absoluta falta de condições financeiras.

    Os pobres clientes da Itapemirim, ao longo dos próximos dias, terão várias tarefas a cumprir, cujo resultado será de qualquer forma frustrante. Mandar e-mail para a empresa, registrando uma reclamação formal e fazer a queixa no site gov.br de modo a poder comprovar que deram à empresa a oportunidade de resolver o problema e assim, para usarmos o termo técnico jurídico, construírem sua causa de pedir, de modo que o juiz convença-se de que não havia outro remédio ao demandante senão reivindicar seus direitos no Judiciário, pois nem a instância administrativa governamental, representada pela ANAC ou pelo PROCON, nem a corporativa representada pela própria companhia aérea, foram capazes de tornar seus direitos realidade. Terão ainda que procurar hospedagem de urgência, no caso de estarem fora de sua cidade de residência. Terão que negociar com as agências de viagem que lhes venderam a passagem uma reacomodação em outros voos ou reembolso das despesas. Terão que obter informações sobre como proceder para encaminhar todas essas providências. E o mais importante, arranjar dinheiro para fazer frente a despesas inesperadas.

    O resultado será frustrante porque mesmo que a pessoa consiga viajar para o destino que havia escolhido ou voltar para sua casa, nada terá sido conforme planejado, e ela terá sofrido angústia, ansiedade e medo. Terá gasto horas do seu dia e reais da sua conta de uma maneira ineficiente, pois não lhe agregou nada em termos de prazer ou qualidade de vida, ao contrário, prejudicou-lhe a saúde e as finanças. Em termos práticos, os custos da transação de viagem de fim de ano dos clientes da Itapemirim compreenderam as três vertentes explicadas pela teoria econômica, mas exponencialmente aumentados pela incapacidade da companhia aérea de continuar suas operações e honrar seus compromissos.

    Se normalmente tais custos são irrecuperáveis, o ideal é que eles sejam limitados ao mínimo necessário. Ter que lidar com uma empresa que, conforme explicou Fernando Capez em sua entrevista, foi claramente mal fiscalizada pelos órgãos reguladores que deveriam tê-la monitorado de maneira mais estrita, aumenta desnecessariamente esses custos irrecuperáveis, a serem incorridos pelos consumidores e em última análise pela sociedade como um todo, devido à necessidade de acionar o judiciário para pleitear indenização. Em suma, as atividades da Itapemirim só geraram ineficiências e prejuízo para a economia como um todo, pois o tempo e dinheiro empregados nas transações com ela acarretaram um grande custo para as partes – passageiros, agências de viagem, hotéis, outras companhias aéreas – sem benefícios concretos em termos de objetivos alcançados pelos participantes da transação.

    E, no entanto, sob a ótica maniqueísta do nosso Presidente, as empresas são as heroínas e os trabalhadores são os perdulários que insistem em reivindicar direitos, causando prejuízos ao país em termos de perda de competitividade. As agruras dos consumidores brasileiros em face de empresas mal fiscalizadas que muitas vezes agem de má fé, como a Itapemirim que, segundo Capez disse à rádio Jovem Pan no sábado à tarde, continuou vendendo passagens mesmo depois de ter suspendido as operações, mostram que muitas vezes a fonte da ineficiência e do custo Brasil são as empresas com suas práticas nebulosas, sobre as quais as agências reguladoras fazem vista grossa.

    O que fazer? Talvez a solução seja seguir o conselho de João Campos e deixar Bolsonaro falar sozinho a respeito de suas obsessões ideológicas sobre os comunistas, os sindicalistas e os trabalhadores. Enquanto ele luta contra seus inimigos, devemos nós procurarmos um candidato que em 2022 formule políticas públicas que enfoquem o problema da competitividade da economia sob a ótica do custo de transacionar em um país em que o consumidor pode ser surpreendido dentro do avião pronto para decolar depois de uma espera de mais de três horas e o comandante avisa a todos que o voo foi cancelado por determinação da ANAC (Isso aconteceu com o jornalista Fábio Murakawa no dia 17 de dezembro). Oxalá as lutas entre o bem e o mal sejam substituídas por discussões sobre o que fazer para melhorar a forma como as empresas brasileiras tratam seus clientes.

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