Narcisas e Narcisos

Um dia Narciso mandou uma espada para Ameinius, seu pretendente mais insistente. Ameinius matou-se perto de Narciso, clamando aos deuses que vingassem sua morte. Ártemis ouviu sua súplica. No local chamado Donacon, em Téspias, Narciso chegou perto de uma fonte d’água, límpida como a prata, e à medida que ele se abaixou, exausto, na grama à beira da fonte para aplacar sua sede, ele apaixonou-se pelo seu reflexo, mirando o lago, embasbacado. Como ele conseguiria suportar possuir e ao mesmo tempo não possuir?

Trecho da história de Narciso, retirada da mitologia grega, conforme contada pelo poeta e romancista inglês Robert Graves (1895-1985) no livro “Os Mitos Gregos”

É claro, conforme ressalta o ex-diplomata israelense, esse enredo constrói-se basicamente a respeito da ambição pessoal de Netanyahu – ele manobra para diminuir as críticas e permanecer no poder o quanto ele puder. Mais importante que isso, ele espera que isso lhe permita diluir a culpa, afastando de si próprio toda e qualquer responsabilidade. [Melhor ainda], “isso pode colocar Gaza em um contexto histórico e épico como um acontecimento que pode tornar o primeiro-ministro o líder em tempos de guerra da grandeza e da glória”.[…] A contextualização por parte de Netanyahu da guerra em Gaza em termos absolutamente maniqueístas – a luz versus as trevas; a civilização versus a barbárie; Gaza como o local do mal; todos os habitantes de Gaza como cúmplices do mal causado pelo Hamas: os palestinos como não humanos – tudo isso está agitando as emoções israelenses e trazendo de volta a memória de uma ideologia no estilo daquela predominante em 1948.

Trecho do artigo “O escorpião vai picar o sapo americano?” escrito pelo ex-diplomata britânico Alastair Crooke e publicado em 20 de novembro

    Prezados leitores, permitam-me compartilhar uma experiência pessoal que tive há algum tempo. Eu trabalhei durante dois anos sob a chefia de uma personalidade que apresentava um distúrbio sério de caráter. Não tenho treinamento em psicologia para fazer um diagnóstico preciso, mas vou valer-me do mito grego de Narciso para lançar luz sobre minha experiência. Afinal, conforme uma das definições de mito da Enciclopédia Britânica ele é “um termo coletivo utilizado para um tipo de comunicação simbólica”, então se eu explorar a história de Narciso como um símbolo poderei comunicar melhor aquilo que vivenciei profissionalmente. Ao final, esse uso do mito para iluminar um aspecto da minha vida servirá como base para eu iluminar o que se passa na cena internacional.

    Conforme o trecho que abre este artigo, Narciso foi punido pela deusa Ártemis que atendeu a um pedido de Ameinius, que amava Narciso, sem ser correspondido, já que o filho da ninfa Liríope e do deus do rio Céfiso orgulhava-se tanto de sua beleza que ele considerava todos os seus pretendentes indignos dele. A punição infligida por Ártemis consistiu em fazer com que Narciso visse sua própria imagem refletida no espelho d’água e se enamorasse dela. Como ele jamais poderia tocar na própria imagem e possuí-la, Narciso preferiu cravar uma faca em seu peito para acabar com o sofrimento de não poder realizar o amor que tinha por si mesmo.

    Considero pertinente utilizar o mito de Narciso para falar da personalidade da minha chefe – era uma mulher – porque para seus subordinados ela apresentava-se como perfeita. Ela sabia tudo mais do que nós, e quando eu mostrava algo novo a ela, que eu tinha descoberto fazendo meus neurônios trabalharem, ela comentava simplesmente que ela já tinha visto aquilo em algum momento no tempo. Como um ser perfeito, ela não errava e se o erro fosse de tal modo flagrante que era impossível fingir que ele não ocorrera, ele tinha sido fruto de um erro anterior, de algum dos seus funcionários, que a haviam levado a trilhar o mal caminho.

    A consciência de que minha chefe tinha um distúrbio de personalidade ficou aguda em mim quando assisti ao filme “A Queda” que narra os últimos dias de Adolf Hitler (1889-1945) no bunker em Berlim, rodeado pelos colaboradores mais próximos. Ao ver o líder nazista vituperar contra tudo e todos, achar sempre um culpado para o que dava de errado e nunca admitir que tinha falhado, eu identifiquei imediatamente semelhanças com o comportamento da minha querida chefe, de quem eu dizia brincando aos meus colegas de infortúnio que na outra encarnação ela havia sido chefe de campo de concentração na Manchúria, região ocupada pelos japoneses durante a Segunda Guerra Mundial.

    Lidar com tipos narcísicos, que só olham para o próprio umbigo, para as próprias necessidades, como se o mundo tivesse que se adaptar a eles, girando em torno deles, como os planetas giram em torno do sol é um desafio, para dizer o mínimo. Minha estratégia foi exercer controle mental para eu não perder as estribeiras e o emprego e começar a procurar uma outra colocação assim que eu tivesse conseguido beneficiar-me do meu período de trabalho sob as ordens da dita cuja, em termos de aquisição de conhecimentos. E assim eu fiz, e quando disse à Narcisa que eu tinha arranjado um outro emprego, ela sentiu-se traída porque eu ousara procurar sair da sua batuta.

    O perigo coletivo em relação aos narcisistas é que a política é um campo que os atrai, por dar-lhes oportunidade de brilhar e de olhar sua imagem refletida nos eleitores que admiram o líder, reforçando assim sua vaidade. Fazendo novamente as devidas ressalvas sobre minha falta de conhecimento especializado sobre psicologia, a leitura do artigo de Alastair Crooke sobre a estratégia adotada pelo primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, para lidar com o ataque do Hamas de 7 de outubro, parece apontar para um homem enamorado da ideia que ele faz de si mesmo e que ele pretende colocar em prática.

    De acordo com o ex-diplomata britânico, para desviar a atenção dos israelenses da tremenda falha de segurança que permitiu que centenas de membros do Hamas invadissem vários kibutzim e fizessem reféns, Netanyahu quer se colocar como o chefe de guerra que irá concretizar a solução final do problema palestino. Com a ajuda militar dos Estados Unidos, que lhes fornecem as bombas e os mísseis, Netanyahu quer bombardear Gaza de tal maneira que não reste pedra sobre pedra e a vida lá se torne totalmente inviável. Aos palestinos restará morrer se ficarem ou fugirem para algum país árabe vizinho, de forma que o sonho do Grande Israel possa ser colocado em prática.

    Crooke chama Israel de escorpião e os Estados Unidos de sapo sobre o qual Israel quer atravessar o rio, tal qual na fábula antiga. E como sabemos, o final não é feliz: o escorpião traiçoeiro pica o sapo, que morre envenenado, e o escorpião acaba morrendo afogado, pois perde a proteção daquele que confiou nele e lhe deu carona apesar da sua peçonha. A ameaça à paz no mundo reside no fato de que se os Estados Unidos continuarem compactuando com o bombardeio de Gaza, fornecendo aos israelenses os meios bélicos para tanto, e assim causando a morte de milhares de civis palestinos, eles perderão toda a credibilidade de que ainda dispõe no mundo e isso pode levar a uma reação por parte dos países árabes, que atuarão militarmente para que a matança não continue.

    Dessa forma, os sonhos de grandeza de Benjamin Netanyahu, que quer se tornar o líder que recriou o Grande Israel descrito na Bíblia, podem desencadear um conflito regional e mundial. Qual será o destino deste Narciso? Ele se matará depois de ter causado o sofrimento de muitos, como narra o mito grego? Ou o povo israelense perceberá que o caminho escolhido por ele é inviável no longo prazo e trocará de líder, como eu humildemente fiz na minha vida pessoal? Aguardemos e torçamos para que o desenlace do drama narcísico não ocorra demasiado tarde para os palestinos.

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Al-Aqsa Reloaded

Na religião e na política, ao contrário, em que pese ainda não haver nada que se aproxime do conhecimento científico, todo mundo considera de bom tom ter uma opinião dogmática, a ser respaldada causando fome, prisão e guerra e a ser protegida da concorrência argumentativa de quaisquer opiniões diferentes. Se fosse possível levar os homens a ter uma mentalidade minimamente agnóstica em relação a esses assuntos, nove décimos dos males do mundo moderno seriam curados.

Trecho retirado do ensaio “Livre-Pensamento” incluído no livro “Ensaios Céticos” do filósofo britânico Bertrand Russell (1872-1970)

O problema é que Benjamim Netanyahu faz tudo para que uma solução política não seja discutida. E é nesse ponto que a comunidade internacional, a Europa, os Estados Unidos, devem dizer a Benjamim Netanyahu que essa guerra não é aceitável. Do Hamas vai-se passar ao Irã, vai-se passar a outros alvos e entrar-se-á então em uma lógica de guerra de civilizações. Quando Benjamim Netanyahu diz que há “de um lado o povo da luz e do outro o povo das trevas”, vê-se bem em qual engrenagem estamos metidos.

Trecho da entrevista dada em 7 de novembro a uma TV francesa pelo ex- Ministro das Relações Exteriores e ex-Primeiro-Ministro Dominique de Villepin sobre a guerra empreendida por Israel contra o Hamas

Guerreiros cristãos que em vão buscais uma e outra vez pretextos para a guerra, […] vós frequentemente tendes sido o terror do vosso próximo, ide lutar contra os bárbaros, ide e lutai pela redenção dos Lugares Santos. Vós, que por um soldo vil vendeis o vigor dos seus braços à ira de outros, armai-vos com a espada dos Macabeus e ide e fazei por merecer a recompensa eterna. Se triunfardes sobre vossos inimigos, os reinos do Leste serão vossa recompensa. Se os vencerdes tereis a honra de morrer no mesmo lugar de Cristo e Deus jamais Se esquecerá que vos achou nos santos batalhões.

Trecho da conclamação do papa Urbano II (1042-1099) à Primeira Cruzada para a conquista de Jerusalém, em 27 de novembro de 1095 no Concílio de Clermont

    Prezados leitores, as coincidências abundam, os ecos do passado retumbam. No dia 7 de outubro de 2023 o grupo palestino Hamas lançou uma operação chamada de “al-Aqsa Flood” contra Israel.  Al-Aqsa é o nome de uma mesquita em Jerusalém, e a razão da referência a este nome é que algumas semanas antes daquela famigerada data o local da mesquita havia sido palco de conflitos entre árabes e judeus. Não é de se surpreender que lá haja disputas entre pessoas de diferentes denominações religiosas. Segundo a tradição muçulmana, foi de al-Aqsa que o profeta Maomé ascendeu ao céu. Por outro lado, nessa mesma esplanada onde foi erigida a mesquita, haviam estado antes o Primeiro Templo de Salomão, construído entre os séculos X e VI a.C., e o Segundo Templo de Salomão edificado no século VI a.C., reconstruído nos tempos de Herodes, o Grande (73 a.C. – 4 a.C.) e saqueado e destruído pelos romanos em 70 d.C., o que levou à diáspora judaica. Para arrematar, al-Aqsa foi a sede da Ordem dos Cavaleiros Templários em Jerusalém, os soldados de Cristo. É a respeito dos defensores da fé que desejo falar inicialmente nesta semana.

    Segundo o verbete “Templarios” do dicionário Nuevo Espasa Ilustrado, os Templários foram uma ordem religiosa e militar fundada por Hugues de Payens (1074-1136) e mais sete companheiros em Jerusalém em 1118 para proteger os peregrinos que se dirigiam aos lugares santos, logo se convertendo na vanguarda do exército cristão na Terra Santa. E que exército cristão era esse? Nada mais nada menos do que aquela formado ante a convocação feita pelo papa Urbano II para que os cristãos parassem de guerrear entre si e fossem combater os infiéis, isto é, os não cristãos no Oriente Médio, conforme mostra o trecho que abre este artigo.

    Um soldado que matasse ou morresse em combate para que os locais onde havia vivido e morrido Jesus Cristo fossem conquistados dos muçulmanos que então os controlavam estaria bendito por Deus, porque suas ações tinham sido todas em nome Dele e para Ele. Uma excelente racionalização para homens praticarem as violências típicas de combates com uma boa consciência, boa o suficiente para subverter totalmente o princípio cristão da humildade em nome de Cristo. E assim, sob os auspícios da finória argumentação do papa iniciou-se a primeira das guerras das civilizações, a que se deu o nome de Cruzadas.

    A primeira e certamente não a última e há quem diga que um novo choque de civilizações está para ser detonado. Uma dessas pessoas é o ex-Ministro das Relações Exteriores e ex-Primeiro-Ministro da França Dominique de Villepin. Na entrevista que é citada na abertura deste artigo, Villepin argumenta que Israel está lutando uma guerra do passado. Não adianta tentar resolver o problema dos palestinos pela força e pela violência, pois isso não leva a lugar nenhum há 75 anos. Quanto mais força Israel usa, mais inseguro o país se torna, então é preciso mudar a abordagem. Tampouco adianta o governo israelense assinar acordos de cooperação econômica ou tecnológica com os países árabes, porque o povo árabe na rua quer antes de mais nada justiça para os palestinos. Para Villepin, é necessário que os países ocidentais façam pressão para Israel parar com esses bombardeios da Faixa de Gaza e começar a negociar seriamente a criação do Estado Palestino. Do contrário, a guerra que hoje se concentra na Faixa de Gaza espalhar-se-á pelo Oriente Médio e colocará de um lado os muçulmanos e de outro os judeus e seus aliados ocidentais.

    Utópico da parte de Villepin propor uma saída política e não militar? Provavelmente, especialmente se considerarmos as palavras de Bertrand Russell que já foi citado neste humilde espaço defendendo o direito dos palestinos de terem seu próprio lar. Afinal, conforme explica o filósofo britânico no trecho que abre este artigo, política e religião são as áreas cujo nível de conhecimento fica o mais longe do nível de conhecimento atingido nas ciências. Ao contrário das ciências, que conseguiram ao longo dos séculos estabelecer procedimentos consensuais para a descoberta da verdade e a mudar tais procedimentos quando assim mostrou-se necessário para o avanço do conhecimento, nem a política nem a religião chegaram nesse patamar de confiabilidade. Cada indivíduo arvora-se o direito de ter uma posição inarredável e de ignorar os argumentos contrários, tudo para a defesa dos seus próprios valores sagrados. Para Russell, a esperança consiste em tentar inculcar nas pessoas um pouco de incerteza em relação a suas próprias opiniões políticas e religiosas, de modo a relativizá-las e colocá-las no seu devido lugar. Só assim o comportamento das pessoas, incluindo a prática bélica, será menos determinado por elas.

    Villepin quer que as partes que hoje se digladiam parem para conversar e achar um modo de conviverem em prol da paz, da prosperidade e da segurança mútuas, Russell propunha que as pessoas fossem levadas por meio da educação para o livre-pensamento a perceber como faltam argumentos lógicos e consistentes para toda e qualquer posição religiosa e política. Em ambos os casos procura-se superar a tendência humana à credulidade e à irracionalidade, as quais sempre vêm à tona em qualquer guerra de civilizações, em que há o choque de dogmatismos.

Prezados leitores, aguardemos o desenrolar dos acontecimentos que prometem se transformar em uma guerra no mínimo regional. Enquanto isso, lembremo-nos que Al-Aqsa tem significados diferentes para cristãos, judeus e muçulmanos. Talvez se todos eles concordassem que al-Aqsa é simplesmente um local de importância histórica conseguíssemos começar a concretizar o sonho de racionalidade e paz de Dominique de Villepin e de Bertrand Russell.

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La dolce vita ou o fim da vida?

Amar e pensar: essa é a verdadeira vida dos espíritos

Aforismo de François Marie Arouet, escritor francês conhecido como Voltaire (1694-1778), citado pelo filósofo britânico Bertrand Russell (1872-1970) em seus “Ensaios Céticos”

 

Da minha parte eu agradeço à sábia natureza que para minha felicidade deu-me à luz nesta época tão criticada por nossos críticos melancólicos. Este tempo profano é particularmente adequado para meu modo de ser, eu adoro o luxo, mesmo uma vida doce, todos os prazeres, as artes na sua variedade, a limpeza, o gosto e os ornamentos.

Trecho retirado do livro “A Era de Voltaire”, escrito por Will Durant (1885-1981) e Ariel Durant (1898-1981) citando um poema de Voltaire denominado “Le Mondain”

Nós compartilhamos com eles a compreensão do limite atingido pelo produtivismo, mas o produtivismo não caiu do céu, ele tem uma causa profunda, que se chama capitalismo. Como consequência, se você quer praticar ecologia e não ser anticapitalista faça jardinagem e chame isso de ecologia, mas isso não é ecologia: não há ecologia política possível fora do âmbito de uma ação anticapitalista determinada e quando digo ação anticapitalista determinada é colocar regras.

Trecho de uma palestra dada pelo político francês Jean-Luc Mélenchon (1951-, ex-candidato à presidência da França, em Estrasburgo em 5 de novembro para falar sobre seu mais recente livro “Faites Mieux

    Prezados leitores, de acordo com o verbete do meu dicionário Larousse, Voltaire foi o ídolo da burguesia liberal anticlerical. Liberal porque ele defendia a liberdade de pensamento, a liberdade de ser julgado de maneira justa por seus pares e não ser objeto de prisão ou privação da propriedade de maneira arbitrária. Anticlerical porque ele denunciou a hipocrisia dos membros corruptos e venais da Igreja e as superstições irracionais herdadas da Idade Média que atrapalhavam o caminho da razão e da ciência. Nesta semana, falarei um pouco sobre a dolce vita proposta e praticada por Voltaire no século XVIII, para contrapô-la ao fim da vida previsto por outro francês, Jean-Luc Mélenchon, em pleno século XXI.

    Conforme o segundo trecho que abre este artigo, Voltaire considerava-se privilegiado por ter nascido no século XVIII, o que havia permitido a ele aproveitar todas as liberdades de que as pessoas da sua classe social e local de nascimento (Paris, França), podiam desfrutar, já que os medos, superstições e proibições impostos pela Igreja Católica durante mais de mil anos estavam sendo superados pelo gozo da vida e das possibilidades que ela oferecia. A Voltaire elas foram muitas, especialmente porque paralelamente às atividades de escritor, poeta, dramaturgo, historiador, filósofo e divulgador da ciência de Newton na França, ele sabia ganhar dinheiro. O autor de Candide era investidor em títulos públicos, importador de produtos, financista e empreendedor e graças a suas atividades econômicas nunca lhe faltaram meios materiais para gozar do luxo, das artes,  de instalações confortáveis e belas onde pudesse dedicar-se à leitura e à reflexão e a amar sua Marquesa de Châtelet, Émilie Le Tonnelier de Breteuil com quem conviveu por vários anos no castelo de Cirey, de propriedade do Marquês de Châtelet. Voltaire foi tão felizardo na vida, que o marido de Émilie nunca fez nenhuma oposição ao relacionamento entre os dois, e continuou a morar no castelo. Além disso, Voltaire teve uma vida longeva, chegando aos 84 anos de idade e seguindo uma receita simples para tanto: evitando os médicos, fazendo exercícios, mantendo uma dieta equilibrada, praticando o jejum e ingerindo líquidos, conforme descreveu seu secretário Longchamp.

    Considerando os frutos que sua abordagem racional e materialista da vida deu nos próximos séculos em termos de proporcionar confortos materiais à humanidade, provavelmente Voltaire sentir-se-ia mais privilegiado ainda se tivesse nascido em meio à riqueza da nossa civilização capitalista. Afinal ele era alegre, inteligente, jovial e otimista. O contrário do que é Jean-Luc Mélenchon, um francês nascido no século XX, mas que em plena abundância de bens materiais e espirituais revela no título do seu mais recente livro “Faites Mieux” a frustração com aquilo que a geração dele fez ao planeta Terra, colocando-o à beira do colapso ambiental.

    Conforme o terceiro trecho que abre este artigo, Mélenchon atribui tal colapso ao produtivismo capitalista. O funcionamento de uma economia capitalista exige a produção ininterrupta de produtos para atender à demanda no mercado e para criar sua própria demanda no mercado, gerando crescimento econômico e fazendo a roda girar. Tal produtivismo é incompatível com a preservação ecológica porque há uma falta de sincronia entre o tempo da produção e o tempo do meio ambiente: um saco plástico leva 30 segundos para ser produzido, é barato, útil e demandado, mas leva 400 anos para desaparecer da face da Terra.

    Daí que para salvar o planeta não é possível mantermos a estrutura capitalista, fundada na produção contínua sem consideração às externalidades por ela causadas. É preciso superar o mercado, tomando decisões coletivas e impondo regras que limitem a autonomia individual para produzir e consumir livremente, como se os recursos naturais fossem infinitos. É a isso que Mélenchon chama de ecologia política, a atuação em prol do meio ambiente pela mudança no sistema econômico e não no nível individual das ações isoladas de plantar árvores ou catar lixo na praia.  Nesse sentido, “Faites Mieux” é uma conclamação às novas gerações para que rompam com os paradigmas vigentes no mundo e criem uma maneira de salvar o planeta do próprio homem, melhorando sua relação com a natureza. Para Mélenchon a catástrofe ambiental, em termos de subida do nível dos oceanos, de secas, da falta d’água, de tornados, de ciclones já está entre nós e devemos agir o mais rápido possível.

    Prezados leitores, será que o século XXI prenuncia o fim da dolce vita proporcionada pela imensa capacidade de criação de riquezas do capitalismo à custa da natureza? Será que devemos ter medo do fim do mundo, como tinham os piedosos e pecadores homens da Idade Média, e expiar nossa culpa por causa da nossa superexploração da natureza? Ou será que nossa atitude deve ser a do otimismo ilustrado de Voltaire, para quem amar e pensar eram a solução de todos os problemas? Será que no final o capitalismo, pela sua capacidade de inovação, encontrará remédios para os problemas que ele mesmo criou? Aguardemos, e enquanto isso, sigamos as máximas de vida voltairianas, pois tenho certeza que até o catastrófico e melancólico Mélenchon também o fará.

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O livre-pensamento de Bertrand Russell

Fica claro que o pensamento não é livre se a defesa de determinadas opiniões torna impossível à pessoa sustentar-se. Também está claro que o pensamento não é livre se todos os argumentos de um lado só podem ser descobertos por meio de uma busca diligente. […] A credibilidade é um mal maior nos dias atuais do que nunca foi antes, porque devido à expansão da educação, é muito mais fácil do que costumava ser espalhar a desinformação, e devido à democracia, a divulgação de desinformações é mais importante do que antes para os detentores do poder. Daí o aumento na circulação de jornais.

Trecho retirado de “O Livre Pensamento e a Propaganda Oficial” do filósofo britânico Bertrand Russell (1872-1970), incluído em “Ensaios Céticos”, publicado em 1928

    Prezados leitores, já abordei aqui neste meu humilde espaço a eclosão do livre-pensamento na Europa no século XVII e inclusive os perigos que muitos viam em tal eclosão. Naquele contexto histórico, livre-pensamento significava o pensamento que não aceitava os dogmas da religião tradicional e por isso repudiava uma interpretação literal da Bíblia. Nesta semana, meu foco será em um outro sentido de livre-pensamento, explorado por Bertrand Russell no ensaio cujo trecho é aqui citado: o sentido de que o livre-pensamento é aquele que está exposto à livre concorrência das diferentes crenças, porque todas elas conseguem expor suas razões, não havendo nenhuma vantagem ou desvantagem legal ou pecuniária a elas atrelada.

    Para o filósofo britânico, esse é um ideal que nunca será atingido plenamente, mas que deve ser perseguido de toda forma, para que nós, seres humanos, fiquemos o mais próximo dele que pudermos, pensando o mais livremente possível e assim chegando à verdade possível. E para fazê-lo a receita é simples: ouvir todos os lados da questão, tentar estabelecer todos os fatos relevantes, controlar nosso viés discutindo com pessoas que tenham um viés oposto e cultivar a prontidão em descartar qualquer hipótese que revelou ser inadequada. Mas seguir tal receita simples é algo complexo, pois requer que enfrentemos obstáculos que Russell em seu ensaio divide em três categorias: educação, propaganda e pressão econômica.

    A educação, tal como ela é praticada, é um impedimento ao livre-pensamento porque ela não compre suas funções básicas de transmitir conhecimento e de inculcar bons hábitos mentais nas pessoas. Pois não basta ensinar às crianças a ler e a escrever, a falar outras línguas e a fazer operações matemáticas. É preciso ensinar-lhes a adquirir conhecimento ao longo da vida, quando estiverem fora dos bancos escolares e a fazer seus próprios julgamentos. Russell dá um exemplo prático de como fomentar essa proatividade cognitiva, por meio da leitura de jornais. O professor seleciona um acontecimento passado que suscitou polêmica e paixões na época em que ocorreu e apresenta a narrativa dele dada por um jornal, aquela dada por outro jornal de tendência oposta e uma terceira narrativa mais imparcial. Os alunos comparam as versões dos fatos, sopesando as evidências apresentadas pelas diferentes correntes, e chegando assim a uma depuração do que realmente aconteceu sob a premissa de que não podemos concordar plenamente com nenhuma proposição que não temos razão de acreditar ser verdadeira. Essa confrontação de narrativas com diferentes vieses estimularia no aluno um ceticismo que o tornaria imune ao apelo a grandes ideais pelo qual pessoas decentes são levadas a viabilizar os esquemas corruptos de pilantras. Assim, a educação que não dá ferramentas para o aluno adquirir por si mesmo o conhecimento por meio da reflexão não permite a ele pensar livremente e o torna escravo dos donos do poder que querem levá-lo a agir de certa forma, inclusive morrer feliz nos campos de batalha.

    Já a propaganda é ofensiva ao livre-pensamento por dois motivos: ela apela a crenças irracionais e não a argumentos sólidos, de modo que possa estimular as pessoas a agir com base na emoção; e ela dá uma vantagem desmedida àqueles que conseguem fazer sua mensagem ser repetida mais vezes, por meio da riqueza ou do poder. Uma mensagem simples, repetida inúmeras vezes, e que tenha como objetivo dar vazão aos instintos e sentimentos do homem, como o medo, o amor, o ódio, a inveja, consolidará nossos preconceitos e vieses, impedindo a prática da reflexão ponderada indispensável para que o livre-pensamento floresça.

    Por último, a pressão econômica impede o livre-pensamento porque ela premia com empregos e meios de sustentar-se aqueles que se conformam com a ortodoxia dominante e pune com desemprego e penúria material os recalcitrantes. Russell observa que com a industrialização acelerada haverá uma maior concentração econômica e as corporações tornar-se-ão mais onipresentes, o que lhes dará poder de vida e morte sobre o pool de possíveis trabalhadores.

    E qual o risco de não haver livre-pensamento pela educação ruim, pela a propaganda onipresente e pela pressão econômica exercida pelas grandes corporações? O risco é o incentivo à credulidade, isto é, à crença em proposições que não foram submetidas ao teste da verdade proposto por Russell com base na análise das evidências disponíveis. E conforme o trecho escolhido para abrir este artigo, a credulidade é mais presente e mais malévola nos regimes democráticos, já que a educação não reflexiva, fundada na absorção passiva de conhecimentos, e a propaganda tornam mais fácil aos poderosos de plantão imporem sem violência física, mas apenas pelo convencimento, seu modo de ver as coisas, e disfarçarem seu domínio econômico sob as vestes de verdades compartilhadas por todos.

    Prezados leitores, em tempos sinistramente interessantes como os que vivemos, de divisões das tribos nas mídias sociais com base nas paixões, o convite de Bertrand Russell ao exercício contínuo do ceticismo e da reflexão como forma de proteção contra a manipulação exercida sobre a população são mais atuais do que nunca. Poderíamos inclusive praticar as recomendações pedagógicas de Russell e lermos artigos na imprensa ocidental descrevendo o terrorismo bárbaro do Hamas e na imprensa árabe, iraniana, chinesa e russa sobre os crimes de guerra do Estado de Israel. Talvez pelo cotejamento das opiniões tão contrárias chegássemos a uma conclusão menos apaixonada do que a que prevalece hoje em dia e leva o mundo ao conflito generalizado. Aliás, o último escrito do filósofo, divulgado em julho de 1970, pouco depois de ele morrer em fevereiro daquele ano, falou sobre a disputa que hoje está mais viva do que nunca: “Nenhum povo em nenhum lugar do mundo aceitaria ser expulso em massa do seu próprio país: como alguém pode exigir que o povo da Palestina aceite uma punição que ninguém mais toleraria?”.

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Voltemos aos salons

Essa sociedade era brilhante porque as mulheres constituíam a vida dela. Elas eram as divindades que a sociedade adorava, e elas davam seu tom. De alguma forma, a despeito dos costumes e dos obstáculos, elas adquiriram educação suficiente para conversar de maneira inteligente com os gigantes intelectuais que elas adoravam entreter. Elas rivalizavam com os homens no comparecimento às palestras de cientistas. À medida que os homens viviam menos no campo, mais na capital e na corte, eles se tornaram extremamente sensíveis aos charmes inefáveis das mulheres – a graça dos movimentos, a melodia da voz, a vivacidade de espírito, o brilho dos olhos, a delicadeza do tato, a ternura da solicitude, a bondade da alma.

Trecho retirado do livro “A Era de Voltaire”, escrito por (1885-1981) e Ariel Durant (1898-1981) sobre os salões organizados por mulheres na primeira metade do século XVIII na França

As mulheres nos acostumam a discutir os assuntos mais áridos e espinhosos com charme e clareza. Falamos com elas sem parar; queremos que elas nos escutem; temos medo de cansá-las ou aborrecê-las. Assim, desenvolvemos um método particular de explicarmo-nos de maneira fácil, e esse método passa da conversa para o estilo.

Trecho retirado do livro “Diálogos” do escritor e filósofo francês Denis Diderot (1713-1784)

Nunca ocorreu aos chineses, como é o caso de todas as nações modernas compostas de brancos, de ter um sistema ético na teoria e outro na prática. Não quero dizer que eles sempre façam jus às suas próprias teorias, mas que eles tentam fazê-lo e espera-se deles que o façam, ao passo que há grandes partes da ética cristã que todos admitem ser boas demais para este mundo perverso. […] Espera-se [na China] que um homem respeite seus pais, seja bondoso com seus filhos, generoso com seus parentes pobres e cortês com todos. Essas obrigações não são muito difíceis de serem cumpridas, e o resultado talvez seja melhor do que aquele do nosso padrão mais alto, o qual a maioria das pessoas não consegue atingir.

Trecho retirado de “Ideais de Felicidade Ocidentais e Orientais” do filósofo britânico Bertrand Russell (1872-1970), incluído em “Ensaios Céticos”, publicado em 1928

Autocontrole moral e proibições externas de atos danosos não são métodos adequados de lidar com nossos instintos anárquicos. A razão pela qual são inadequados é que tais instintos são capazes de muitos disfarces como o Diabo das lendas medievais e alguns desses disfarces enganam mesmo os eleitos. O único método adequado é o de descobrir quais são as necessidades da nossa natureza instintiva e então procurar a maneira menos prejudicial possível de satisfazê-las.

Trecho retirado de “As Máquinas e as Emoções” do filósofo britânico Bertrand Russell (1872-1970), incluído em “Ensaios Céticos”, publicado em 1928

    Prezados leitores, na semana passada, ao explicar a figura das Moiras na mitologia grega, eu mencionei o destino infeliz do povo palestino, que tudo leva a crer será como o dos peles-vermelhas dos Estados Unidos, que viraram peça de museu. Não vou aqui me juntar ao coro dos analistas que estão explicando a nós as origens históricas do conflito, pois não tenho nada de mais criativo a dizer que já não tenham dito sobre o porquê de árabes e judeus brigarem. Vou simplesmente aventar uma teoria, a de que a convivência seria mais pacífica se as mulheres tivessem uma voz mais ativa nas respectivas sociedades, coisa que elas definitivamente não têm no mundo árabe e estão perdendo em Israel, que cada vez é mais politicamente dominado por judeus ortodoxos, como mostra a coalizão de extrema-direita que governa agora o país, sob a liderança de Benjamim Netanyahu. E para corroborar minha teoria, vou dar-lhes um exemplo de período histórico em que as mulheres reinavam, qual seja a primeira metade do século XVIII na França, especificamente em Paris, a cidade dos “salons”.

    Os salons eram reuniões de personalidades do mundo da arte, da literatura e da política na casa de alguma mulher da sociedade, entre as quais podemos citar Claudine Alexandrine de Tencin (1681-1749), mãe do filósofo Jean Le Rond d´Alembert (1717-1783), Marie Thérèse Rodet Geoffrin (1699-1777) e Marie de Vichy-Chamrond Du Deffand (1697-1780). Conforme explica o trecho que abre este artigo, eram mulheres suficientemente educadas e de fino trato para oferecer lautos jantares e no entrementes manter discussões com Fontenelle, Montesquieu, Marivaux, Prévost, Helvétius, Astruc, Marmontel, Hénault, Duclos, Mably, Condorcet, Voltaire e até o Conde de Chesterfield, já mencionado anteriormente neste humilde espaço quando tratei da origem dos preceitos morais. Falava-se de tudo nessas reuniões: dos escândalos na corte, das novidades políticas, das fofocas sobre gente importante, mas também dos recentes lançamentos literários, das peças de teatro então encenadas e das ideias que pululavam com o fim do garrote intelectual da Igreja Católica, que fazia cada vez menos a cabeça das elites.

    A vantagem desses salons, em que as mulheres ditavam as regras de como proceder e os objetos de discussão, é que eles permitiam a homens que estavam se tornando cada vez mais citadinos e que passavam cada vez menos tempo no campo a realizar atividades masculinas, como a caça e a guerra, a tornarem-se mais civilizados. Isso significava estabelecer a polidez e a cortesia como princípio geral da vida em sociedade, seja para disputar com outros homens a respeito de ideias, seja para relacionar-se na corte em Versalhes. O filósofo Diderot, conforme o trecho que abre este artigo, explica a influência feminina sobre os homens sob o ponto de vista do funcionamento mental: à guisa de explicar às mulheres suas geniais teorias de maneira que pudessem se fazer entender e ser admirados por elas, eles se esforçavam em ser claros e simples, e isso acabava refletido no modo como escreviam.

    Assim é que o século XVIII na França ficou conhecido pela cortesia predominante e tal estado de coisas só foi suplantado com a Revolução em 1789, quando as mulheres saíram de cena, como observou a pintora Élisabeth Vigée-Lebrun (1755-1842), violentamente afastadas por homens fanáticos, que mataram milhões em nome de suas ideologias e iniciaram um ciclo de guerras que duraria até a queda definitiva de Napoleão, em 1821. Tanto assim que o filósofo Bertrand Russell, no ensaio “Ideais de Felicidade Ocidentais e Orientais” afirma que a China praticava a polidez no século XX, como se fazia na Europa no século XVIII.

    A respeito dessa característica chinesa, Russell não a associa à influência feminina, mas à de Confúcio (551 a.C.-479 a.C.). E essa ênfase na cortesia tem um aspecto positivo explicado pelo filósofo em seu ensaio. Ela revela uma moral mais prática e menos ambiciosa do que a moral cristã, predominante no Ocidente. O princípio básico dos ensinamentos de Jesus Cristo é o de amar aos outros como a si mesmo e que todo conflito deve ser evitado. Mas tal preceito foi raramente aplicado no Ocidente, como podemos ver pelo histórico de guerras em que os países deste lado do mundo se envolveram. Conforme explica o trecho que abre este artigo, os países cristãos adotam na teoria um código de ética da não violência e do amor ao próximo que na prática é letra morta, ao passo que os chineses adotaram, sob a influência de Confúcio, um código de ética mais fácil de ser concretizado porque não pede muito de cada um, ao contrário do ideal cristão: basta que o indivíduo trate a todos com respeito e polidez e ele já terá cumprido suas obrigações e já terá tido um impacto positivo sobre a sociedade.

    Para Russell, o perigo de uma ética sublime, mas de difícil execução, considerando a natureza humana, é que ela se manifesta de qualquer jeito, pois é instintiva. Conforme ele explica em “As Máquinas e as Emoções”, ao não reconhecermos a nossa propensão à anarquia e reprimi-la sob a inspiração de um ideal de conduta inexequível na maior parte das vezes, é que a mente humana acaba encontrando maneiras de dar vazão a ela sob os mais variados disfarces de racionalização. Russell refletia nos “Ensaios Céticos” sobre a Primeira Guerra Mundial, mas sua análise pode ser aplicada ao choque de civilizações que se prenuncia em pleno século XXI entre as religiões abraâmicas, o cristianismo, o judaísmo e o islamismo, que se arvoram cada uma como a religião do Deus único e por isso apresentam-se como proponentes da verdade, trazendo em seu bojo a violência que penetra insidiosamente sob o disfarce das proposições metafísicas.

    Prezados leitores, oxalá que a ideia de organizar soirées regada a vinho, a conversas inteligentes e a disputas nos limites da decência, venha à cabeça de alguma mulher distinguée em algum possível palco da guerra que se anuncia neste ano de 2023.  Ela prestaria um grande serviço à humanidade se distraíssem com comida, bebida e espirituosidade os fanáticos que hoje reinam.

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