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Pior que tá não fica?

Posted by on 04/10/2022

O que não é normal é a nossa superconfiança nos poderes de líderes carismáticos, os únicos capazes de nos proteger de grandes ameaças ou de colocar comida em nossa mesa. Atividade de baixa reputação junto à sociedade, a política precisa não apenas ser limpa, mas demonstrar que é limpa. É preciso que acordos de gabinetes sejam substituídos por alianças programáticas, que mostrem aos eleitores os temas e os motivos que unem, mesmo que pontualmente, partidos e políticos outrora antagônicos. O Brasil do futuro é o país de propostas e propósitos, não pode ser o país do cheque em branco.

Trecho retirado do artigo “Voto sem reflexão” do cientista político Magno Karl, publicado na edição de 02 de outubro do jornal O Globo

O Brasil está se condenando à mediocridade, a uma enorme concentração de renda, a uma população de zumbis que não têm acesso à educação, não sabem operar com as ferramentas do mundo contemporâneo. […] Nosso destino é cada vez mais correr em direção ao Terceiro, Quarto, Quinto Mundo, a história é implacável, não tem essa. […] Ninguém vota num candidato, vota contra o outro.

Trecho da entrevista do humorista Marcelo Madureira, em entrevista ao site O Antagonista, em 3 de outubro, comentando sobre o resultado das eleições do dia 2 de outubro

    Prezados leitores, a Legisla Brasil é uma ONG que presta um serviço de utilidade pública aos cidadãos, avaliando a atuação dos parlamentares brasileiros em relação a quatro quesitos básicos: produção legislativa, fiscalização do Poder Executivo, capacidade de articulação e cooperação com outros agentes políticos e alinhamento em relação à votação da maioria do partido.  Esses quesitos são divididos em 17 indicadores que descem a detalhes da atuação parlamentar, tais como o número de relatorias, as emendas de medidas provisórias e o número de requerimentos de audiência pública. A avaliação produz um ranking dos deputados cinco estrelas que, na atual legislatura, somam 41, em um total de 513 deputados federais, ou seja, míseros 8% do total.

    Felizmente, eu fiquei sabendo desse site e escolhi meu candidato levando em conta quantas estrelas a Legisla Brasil deu a ele e verificando na página da Câmara Federal os projetos com os quais o deputado esteve envolvido, o que ele conseguiu aprovar de sua autoria e o que ele conseguiu aprovar de autoria de outros colegas. Minha esperança era, em votando em um candidato que tivesse já mostrado serviço, se ele fosse eleito isso premiaria o bom comportamento do meu representante e o estimularia a continuar nessa rota do bem.

    Pois bem, meu candidato não foi eleito em São Paulo. Daquela lista dos que exerceram seu mandato da melhor maneira possível, 29 se reelegeram, o que corresponde a mais ou menos 70% deles. Considerando que a taxa de renovação da Câmara dos Deputados foi de 39%, menor do que em 2018, os deputados federais cinco estrelas que conseguiram se manter no cargo para a próxima legislatura tiveram um desempenho nas urnas relativamente melhor do que os deputados federais não cinco estrelas. É algo a se comemorar, se não fosse pelo fato de termos ainda eleito novamente, entre outros, o Tiririca em São Paulo para o quarto mandato, Aécio Neves em Minas Gerais para um quinto mandato e Átila Lins que terá seu nono mandato como deputado federal pelo Amazonas. Em comum esses três têm o fato de terem sido avaliados com duas estrelas pelo Legisla Brasil.

    Ou seja, parece que a reeleição dos parlamentares de melhor qualidade é uma coincidência feliz, e que os brasileiros ao escolherem seus representantes no Legislativo o fazem sem realizarem um esforço sistemático de averiguação da ficha suja ou limpa do candidato, tanto no aspecto de contas a prestar à Justiça, quanto no aspecto do que o indivíduo fez em prol dos seus representados. Pois se houvesse essa tentativa de melhorar o nível da atuação parlamentar, nós não elegeríamos seguidas vezes pessoas que têm um desempenho pífio e elegeríamos todos aqueles que são muito bem avaliados. Não que a Legisla Brasil tenha a última palavra em matéria de quem é bom e de quem é ruim, mas se as pessoas ao menos consultassem o site da Câmara Federal (camara.leg.br) teriam informações básicas sobre de quantas votações em plenário ele participou e quanto ele gastou da verba de gabinete. .

    No entanto, a julgar pelos títulos de alguns dos eleitos, que começam com “Capitão”, “Delegado”, “General”, “Pastor”, o critério de escolha dos eleitores foge de métricas qualitativas ou quantitativas, e acaba sendo a identificação com uma tribo que compartilha os mesmos valores morais e a mesma visão de mundo. O pessoal de direita que quer a lei e a ordem vota nos capitães, delegados e generais, os evangélicos votam nos pastores, o pessoal de esquerda que quer defender o direito das minorias vota em homossexuais, transsexuais, “movimento pretas” e por aí vai. Se o eleito de fato cumpre suas promessas parece pouco importante, o importante é sempre votar em alguém que pertença a sua tribo.

    Considerando o modus operandi do eleitor brasileiro, será que algum dia concretizaremos a visão do país do futuro, exposta por Magno Karl no trecho que abre este artigo? Será que passaremos a um estágio mais amadurecido da democracia, em que abandonaremos o foco nos lideres carismáticos salvadores da pátria, nos chefes de tribo que expressam nossos valores mais profundos? Será que passaremos a eleger indivíduos normais, que serão forçados a entregar resultados porque serão chamados a prestar contas a cada quatro anos com base no julgamento informado de cada um de nós? Ou será que medir a eficiência da atuação dos políticos não está na nossa psiquê e estamos fadados a medir só o quanto os odiamos e o quanto os amamos, que segundo Marcelo Madureira, na entrevista que abre este artigo, parece ser o nosso critério de votação?

    Prezados leitores, será que o slogan tão eficiente de Tiririca para se eleger “Vote em Tiririca, Pior que tá não fica” ficará para trás nos próximos anos e rumaremos rumo ao abismo dos vários mundos mencionados por Marcelo Madureira, pela nossa displicência no exercício da democracia? Aguardemos, se sobrevivermos ao segundo turno das eleições presidenciais.

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