Um vislumbre do futuro de destruição dos empregos foi dado no início de setembro por um estudo detalhado realizado pela famosa empresa de consultoria McKinsey. O estudo estimou que 60% dos empregos atuais nos Estados Unidos sofrerão impacto da inteligência artificial até 2030. E um terço, 33%, daqueles 60% sofrerá redução no empregos e /ou horas trabalhadas. […] De acordo com a pesquisa da McKinsey, o ‘custo’ para os trabalhadores será de $ 7 trilhões. A inteligência artificial cortará o número de empregos nas empresas em 50% quando ela for implementada, aumentando assim os ‘lucros’ em $ 13 trilhões. Em outras palavras, a IA vai acelerar dramaticamente as tendências de desigualdade, que já são avassaladoras nos Estados Unidos. Tendo já diminuído de 64% para 56% do total da renda nacional, a participação do trabalho vai diminuir ainda mais até 2030
Trecho retirado do artigo Amazon, a destruidora de empregos hoje, ontem e amanhã publicado em 7 de setembro por Jack Rasmus, doutor em economia política e professor de economia e política no St. Mary’s College, na Califórnia
Os estados universais […] são essencialmente instituições negativas. […] são produtos de minorias dominantes: isto é, de minorias criativas que perderam seu poder criativo.
Trecho retirado do livro “Um Estudo da História”, de Arnold Toynbee, historiador britânico (1889-1975)
Sob Trajano, o Império Romano atingiu sua máxima extensão e o ouro que vinha da Dácia permitiu a Trajano realizar construções monumentais, em que pese elas terem feito muito pouco para diminuir as dificuldades econômicas da Itália.
Trecho retirado do Guia Arqueológico de Roma, de Adriano La Regina
Prezados leitores, quem de vocês já não comprou um livro pela Amazon, a multinacional do comércio eletrônico? Confesso que já o fiz muitas vezes, por causa da mesma comodidade usufruída pelos usuários do Uber, outra empresa global surgida nos Estados Unidos. Com alguns cliques, você faz sua compra do livro que só existe no exterior e pode aproveitar e pedir vários ao mesmo tempo, para que o frete por unidade saia mais barato. É um modelo de negócios inovador e por enquanto imbatível. E, no entanto, como mostra Jack Ramus, esse modelo, baseado nas vendas virtuais e que vem sendo copiado por outras empresas americanas como a WalMart e a Macys, tem seu lado negro. Ele acabou com o emprego das pessoas que trabalhavam nas ultrapassadas livrarias físicas. A Amazon, que investe pesadamente em inteligência artificial, está investindo em drones para a entrega de produtos, o que vai forçar serviços de entrega como Fedex e o UPS a deixar de lado os caminhões e levar os caminhoneiros à obsolescência.
É verdade que milhares de depósitos de produtos são abertos em todo o território americano e no mundo que precisam de trabalhadores, mas de acordo com o artigo, esses empregos serão de curta duração. A empresa de Jeff Bezos está desenvolvendo robôs que reconhecem a voz humana e conseguem realizar tarefas simples do ponto de vista cognitivo, como colocar produtos em prateleiras, receber e processar pedidos. A conclusão de Jack Ramus é que em que pese o valor de mercado da Amazon ser de um trilhão de dólares e o patrimônio do seu presidente de 165 bilhões de dólares, os malefícios causados por esse novo modo de fazer negócios, baseado na digitalização e na automatização total dos processos, superam os benefícios, que acabam sendo usufruídos majoritariamente pelos acionistas da empresa.
Criou-se um círculo virtuoso para os muito ricos e um círculo vicioso para os deploráveis. Os cortes de impostos de Donald Trump, que em 2018 somaram 300 bilhões de dólares e responderam por 49% dos lucros das 500 maiores empresas americanas, têm sido usados para pagar dividendos aos acionistas e para a recompra das próprias ações, o que aumenta o valor delas na bolsa de valores e os rendimentos dos investidores. Quanto aos trabalhadores, a quem foi dito que as benesses fiscais dadas às empresas as levariam a investir e a criar empregos, sobra pagar a conta em termos de desemprego ou empregos de meio período ou temporários, que oferecem menos benefícios como assistência médica e fundo de pensão. Isso, por sua vez, leva à estagnação da renda, à incapacidade de consumo e de poupança, à impossibilidade de aprimoração de competências, o que diminui ainda mais a empregabilidade futura num mundo de drones e robôs.
Ao mesmo tempo que a Bolsa de Nova York e a Nasdaq batem recordes e os deploráveis se veem em situação cada vez mais precária, vivendo à base de crédito e de dívidas, os Estados Unidos continuam presentes em todo os cantos do mundo, gastando o dinheiro que o americano médio já não tem em seu bolso em intervenções militares. Essa dicotomia foi bem descrita por Arnold Toynbee quando fala em seu livro sobre os impérios, a que ele chama de estados universais, dos quais ele dá vários exemplos, a começar do Império Romano: de um lado há uma minoria dominante que é incapaz de dar respostas aos desafios do mundo e que se vale de seu poder para criar uma entidade política forte e militarizada que a protege do colapso iminente e cria a ilusão de grandeza e de eternidade; de outro lado há um proletariado interno que vive sob o jugo da elite, mas que em algum momento acaba achando uma brecha e criando suas próprias respostas.
Os fatos mostram que o império americano vive esse abismo. O prêmio Nobel de Economia Joseph Stiglitz e colegas calcularam que as guerras no Iraque e no Afeganistão tenham custado entre cinco e seis trilhões de dólares, o que dá 50.000 dólares por cada lar americano. Dinheiro esse, diga-se de passagem, ainda não pago, já que o império, que tem o monopólio de emissão da moeda mais usada nas operações comerciais no mundo, pode emitir bônus do tesouro à vontade, porque sempre haverá compradores, ou pelo menos tem havido até agora. Por outro lado, o economista Edward Wolff estimou que a grande recessão de 2018 e seus desdobramentos tenham diminuído o patrimônio médio de cada família americana para 57.000 dólares em 2010, sendo que três anos antes ele era de quase o dobro.
Arnold Toynbee afirma que a queda dos estados universais é inevitável, porque eles são intrinsecamente frágeis, obra de elites que perderam a capacidade de criação e permaneceram apenas com a cobiça e a sede de poder. Os Estados Unidos, desde 11 de setembro de 2001, invadiram o Iraque, o Afeganistão (para combater o grupo terrorista Al-Qaeda), a Líbia, possibilitaram a invasão do Iêmen (fornecendo ajuda militar à Arábia Saudita) e agora estão na Síria (acreditem se quiser, para proteger a Al-Qaeda, que agora transmutou-se em rebeldes acossados pelo ditador Assad em Idlib). Talvez o próximo na lista seja o Irã. Donald Trump, que prometeu na campanha defender os interesses do proletariado americano, até agora tem falhado, pois a política externa continua tão agressiva e portanto tão perdulária quanto antes, e a recuperação econômica tem sido usufruída pelos que investem em ativos financeiros, não pelos que vivem do trabalho. Provavelmente suas boas intenções não eram páreo para os poderosos interesses daqueles que querem que o império continue suas esplendorosas exibições mundo afora.
Talvez o ocaso da Pax Americana demore anos ou décadas, ou talvez um evento próximo desencadeie um completo desmoronamento do castelo de areia, fundado na cobrança da conta dos americanos sem emprego e sem esperanças. Uma coisa é certa: o pó gerado pela demolição, controlada ou não, causará muitos transtornos aos espectadores. Esperemos não estar por perto.