E eu tenho uma grande quantidade de praticamente tudo. Advogados, dinheiro, culhões, tudo o que vier a sua cabeça eu tenho. Acredite, não queira entrar em uma briga comigo. Porque você vai acabar na Vila dos Perdedores. Disseram para mim que vocês têm uma Vila dos Perdedores aqui na Rússia? O Atol Gulag ou algo parecido? Tanto faz. Ainda funciona? Espero que sim. É melhor colocar todos os perdedores juntos, fora da vista. No final, eles ficam mais felizes.
Trecho retirado do artigo “When the Donald met the Vlad” do escritor Christopher Buckley, a respeito de um hipotético encontro entre os Presidentes da Rússia e dos Estados Unidos
O humor desempenha um papel fundamental na honestidade também. Permite às pessoas ‘mostrarem ser inteligentes sem ser nerds’ e tem como alvos naturais o dogma, o absolutismo e o auto engrandecimento. De maneira ainda mais mágica, ele cria um universo paralelo em que as pessoas ou grupos podem mudar de ideia, admitir suas falhas ou falar a verdade aos poderosos (como os bobos da corte) sem as consequências funestas em termos de reputação ou de formação de tribos que ocorrem no mundo real, não engraçado.
Trecho retirado do artigo “Healthy ridicule” a respeito de um festival a ser realizado na Irlanda na cidade de Kilkenny de 9 a 12 de novembro de 2017 chamado de Kilkenomics que pretende juntar a economia e a comédia
Prezados leitores, não deixem de ler a transcrição da conversa íntima entre Donald e Vlad, é de chorar de rir. Coloquem no Google o nome do autor e do título, conforme mencionados na abertura deste artigo. É um humor de primeira grandeza, porque apresenta as características de Donald Trump de maneira serena, sem apelações, sem ódio, o que faz com que seja diversão garantida para pessoas de todos os quadrantes ideológicos. Mostra seus cacoetes linguísticos, seu narcisismo, seu otimismo inveterado, sua certeza sobre tudo (inclusive sobre o fato de que o mundo se divide em ganhadores e perdedores e de que ele próprio pertence ao primeiro grupo) e seu provincianismo americano triunfante (ou como dizem os próprios americanos, o caráter excepcional da Nação mais importante da face da Terra), demonstrado quando ele pede ao líder russo, que lhe oferece caviar, para dar-lhe frango frito da rede KFC, como se os dois tipos de comida estivessem no mesmo patamar gastronômico. Caviar quem usa é a esposa Melania, para fazer máscara facial no filho Barron e evitar espinhas no menino que idolatra Putin e tem um pôster do líder russo em seu quarto na Trump Tower. Em suma, a qualidade da diatribe está na sua capacidade de revelar a personalidade do homem de maneira que pessoas como eu, que não descartam Trump como um palhaço fascista e torcem para que ele dê certo
Uma pena que tal tipo de humor seja raro, e no mais das vezes a internet e as mídias sociais pululam com piadinhas de mau gosto ou caricaturas toscas que só são interessantes para os detratores do objeto do escárnio. Há três semana recebi um vídeo que gozava do racismo do novo presidente americano por intermédio de um narrador de notícias holandês que falava sobre como seus conterrâneos expulsaram os espanhóis do país no século XVII. Como considero essa uma das tantas críticas rasteiras feitas ao Aprendiz não achei engraçada a rememoração da história da Holanda. Tomar medidas para proteger as fronteiras é uma das prerrogativas do chefe do Executivo nos Estados Unidos e certamente isso envolve estabelecer critérios sobre que tipo de pessoas são desejáveis. Criticar qualquer esforço de discriminação, isto é, de diferenciação, como sendo racista é presumir que os seres humanos tenham uma capacidade inata de conviver de maneira harmônica com aquilo que é diferente e que contraria suas expectativas. Isso pode ser um desejo de certos grupos, e isso pode até verificar-se na prática em certos momentos e certos lugares, mas não sempre. Em um momento em que a Europa vive as consequências da política desastrosa do Ocidente, liderado pelos Estados Unidos, no Oriente Médio e na África, que levou à destruição de vários países e provocou a migração em massa, achar que será possível aos países ricos absorver esses contingentes sem atropelos é ser bem otimista. E claro, há quem ache que é obrigação dos países ocidentais receber os refugiados políticos e econômicos do Terceiro Mundo de braços abertos, considerando as práticas colonialistas de séculos passados e seus erros recentes. Pode ser realmente uma punição exemplar à Europa e aos Estados Unidos, mas por outro lado não há como negar que é direito dos cidadãos europeus e americanos escolherem não ser imolados para expiar culpas dos seus antepassados ou culpas dos governos das últimas décadas, os quais executaram políticas externas desastrosas que serviram mais determinados grupos de interesse do que o povo em geral.
Em suma, Donald Trump acredita muito em si mesmo, é cafona, megalomaníaco e seus discursos são pontuados por declarações parentéticas e pelo recurso retórico da aposiopese, que o leva a fazer uma afirmação sucinta e esperar pelo efeito que ela terá sobre a plateia. Por outro lado, dizer que ele é racista é ingenuidade daqueles que presumem que tudo o que a grande imprensa publica é bem apurado e objetivo, ou má fé por parte dos que se beneficiam da globalização e por isso querem que ela continue vigendo. Daí que o humor inteligente mostra o motivo por que ele é um grande comunicador e de ter conseguido arrebanhar a presidência da rainha ungida pelos sábios Hillary Clinton, e ao mesmo tempo mostra que essas mesmas qualidades podem transformar-se em defeitos se ele não souber aprender com os erros que certamente cometera e já cometeu, neófito que é na política. Trump sofreu um grande revés na semana passada com a renúncia de Michael Flynn, conselheiro de segurança nacional, que era o mais enfático defensor da paz com a Rússia. Isso mostra que as intrigas palacianas correm soltas e que aqueles interessados na presença do Império americano em todo o mundo e sempre estão fazendo de tudo para preparar a cama para o impeachment do Presidente. O Aprendiz precisa aprender logo a tornar-se profissional, se ficar enamorado de sua própria imagem de homem mais poderoso do universo poderá ser devorado pelos chacais que rondam o Narciso, à espera de qualquer deslize do mancebo. No sábado dia 18, Donald reuniu 90.000 pessoas em Melbourne na Flórida, para arregimentar a base, talvez como meio de defesa contra os que querem tirá-lo do poder no tapetão.
Prezados leitores, a acrimônia da política americana poderá ser fichinha perto da nossa, nas eleições presidenciais de 2018, caso as tendências apontadas nas últimas pesquisas eleitorais sejam concretizadas. Os resultados da CNT/ MDA mostram Lula com 30,5% e Jair Bolsonaro com 11,3%, os únicos candidatos ou possíveis candidatos cujo desempenho melhorou. Rir será fundamental para lidarmos com um hipotético segundo turno entre o sapo barbudo e o aloprado da direita. Espero que até lá surjam humoristas na cena tupiniquim que sejam tão perspicazes como Christopher Buckley foi mostrando o macho man sorrateiro Vladimir Putin e o show man galo de briga Donald Trump partilhando uma refeição no Kremlin. Afinal, como afirmou Rory Sutherland, o humor inteligente é sempre o último refúgio de sanidade e serenidade quando as tensões estão acirradas e as opiniões dramaticamente divididas entre as diferentes tribos.