The winner takes it all
The loser has to fall
It’s simple and it’s plain
Why should I complain?
Trecho da letra da música “The Winner Takes it All”, do grupo Abba
O mensalão era a única forma de governar o Brasil
Palavras de Lula ao ex-presidente uruguaio José Mujica de acordo com os jornalistas Andrés Danza e Ernesto Tulbovitz, autores do livro Uma ovelha negra no poder
Prezados leitores, houve eleições na quinta-feira passada, dia 7 de maio na Grã Bretanha. Não há feriado, é um dia normal de trabalho e a única diferença perceptível é que há sinais em certos locais indicando ser ali local de votação. Afinal, o voto é facultativo, portanto não faz sentido que as pessoas parem suas atividades, como acontece no Brasil. O motivo de eu abordar as eleições não é para elogiar o fato de que o cidadão pode escolher votar ou não, ao contrário da obrigatoriedade de exercer nosso direito a que nós brasileiros estamos submetidos. O que chamou minha atenção foi o sistema de votação deles, que chamam de first-past-the post e a que denominarei para tropicalizar, Ao vencedor as batatas, o que chega primeiro leva tudo.
Nessas últimas eleições isso significou na prática que os Conservadores mantiveram-se no poder porque foram os primeiros e derrotaram os Trabalhistas, apesar das previsões das pesquisas de opinião de que nenhum dos partidos conseguiria obter a maioria. Esse sistema de first-past-the-post fica claro quando analisamos os números. Os tories obtiveram 36,9% dos votos, o que lhes deu 331 cadeiras, o Partido Trabalhista obteve 30,4% dos votos, o que lhes deu 232 cadeiras, o Partido Nacionalista Escocês obteve 4,7% dos votos, o que lhes deu 56 cadeiras no Parlamento, os Liberais Democratas obtiveram 7,9% dos votos, conseguindo colocar oito representantes no Parlamento e o Partido Verde obteve 3,8% dos votos, elegendo 1 MP, como eles chamam. Agora aqui vem o dado espantoso: o UKIP, o partido polêmico que quer o Reino Unido fora da União Europeia e prega a imposição de limites à imigração, obteve 12,6% dos votos, muito mais do que todos os outros partidos pequenos e sabe quantos representantes terão em Westminster? Um único! 4 milhões de pessoas votaram no UKIP, ao passo que menos da metade desse número votou no SNP que quer a independência da Escócia, e no entanto estes ficaram com 56 das 59 vagas para aquele país no Parlamento do Reino Unido.
Em suma, tal sistema faz com que os dois grandes partidos, que coincidentemente são o azul e o vermelho como no Brasil temos os tucanos e os petistas, fiquem com 87% das cadeiras tendo angariado somente dois terços dos votos. Digo somente porque em comparação com o desempenho deles na década de 1950, quando conseguiam mais de 95% dos votos, eles vêm tornando-se menos representativos a cada eleição que passa. É claro que essa pouca representatividade foi duramente criticada nas eleições, especialmente por aqueles que perderam. Hoje li um artigo no jornal em que a autora dizia que tal sistema está ultrapassado porque reflete um Reino Unido que votava de acordo com divisões de classe entre trabalhadores e capitalistas. Hoje, a sociedade está muito mais diferenciada e as pessoas querem ter mais opções de escolha política.
Diante dos números acima, como negar que os britânicos estão sendo representados de maneira no mínimo distorcida e para os mais exaltados totalmente não democrática? Só que há um motivo por trás desse sistema que dá ao vencedor as batatas, que é muito legítimo e o motivo pelo qual estou aqui falando dele. Ele permite a formação de uma maioria no parlamento que forma um governo. A tal da corrida de cavalo entre conservadores e trabalhistas leva muitas vezes os eleitores a votarem útil para livrarem-se de um candidato, o que muitas pessoas que simpatizavam com as propostas do partido de Nigel Farage, o UKIP, fizeram, votando nos conservadores para evitar um governo de esquerda chefiado por Ed Miliband considerado muito radical porque queria, entre outras coisas, aumentar o imposto sobre imóveis a partir de uma determinado valor. Por outro lado, permite que haja um claro vencedor ao final, que terá força para executar determinadas políticas pois há votos garantidos pela maioria formada pela representação distorcida.
Prezados leitores, há algumas semanas eu propus que copiássemos o modelo de Cingapura que pune com eficiência a delinquência juvenil como uma tentativa de coibir o cometimento de crimes mais graves por adolescentes e jovens no Brasil. Fiz essa proposta colocando as devidas ressalvas sobre as diferenças culturais, geográficas e econômicas entre uma cidade-Estado e um país de dimensões continentais. Repetirei a dose agora em relação a esse sistema de representação britânico e da mesma forma colocarei minha pitada de sal. O fato é que o Brasil tem 32 partidos atualmente, número que continua aumentando a cada novo recolhimento e validação de assinaturas pelo STF, prevendo-se que cheguem a 73.
O resultado é que embora todas as opiniões, ou falta delas, tenham a possibilidade de encontrarem expressão no nosso Congresso, isso leva o ato de governar a ser um ato primordialmente de negociar, barganhar, criar ministérios e secretarias para ter cartas na mesa do pôquer de Brasília, esperar quem vai pagar para ver, quem vai blefar, quem vai jogar a toalha ou virar a mesa e sair bufando, com raiva de ter perdido. Vemos essa pantomima ocorrer no Brasil diariamente, as marchas e contramarchas do presidente para garantir apoio a seus projetos. Não chegarei a falar que o Lula ou o Fernando Henrique ou a Dilma são vítimas desse sistema do é dando que se recebe, porque afinal quando se elegeram sabiam quais as regras do jogo e as aceitaram e praticaram, cada um a seu modo. Mas não há como negar que a margem de manobra do Presidente da República Federativa do Brasil é muito pequena. Estamos em uma sinuca de bico, em que temos um sistema que dá muitas atribuições legislativas à União, em termos das áreas sobre as quais ela tem responsabilidade (29, para ser extaa, de acordo com o artigo 22 da Constituição) e ao mesmo tempo estabelece todo o trâmite de análise e aprovação de projetos de lei pelo Congresso, Congresso este que historicamente tem muito pouca iniciativa em termos de propostas. Copiamos o presidencialismo dos Estados Unidos, mas nos Estados Unidos o governo é muitíssimo mais descentralizado do que aqui, e o presidente acaba tendo como atribuição principal a política externa.
Por isso é que contra o mensalão, petrolão e compras de votos proponho um parlamentarismo nos moldes britânicos, em que a representatividade é sacrificada em certa medida em prol da formação de uma sólida maioria e por tabela de um governo forte. Sei que é uma proposta que nunca será aceita, porque nossa democracia ainda é muito tenra, ao contrário da inglesa, cujo parlamentarismo está em vigor no mínimo desde 1688. Falar em calar a voz dos nanicos no Brasil seria um blasfêmia quando há pouco mais de 30 anos nem grandes nem pequenos partidos podiam se manifestar plenamente. No entanto, fica aqui registrada minha proposta para colocarmos um pouco de ordem neste templo cheio de vendilhões.
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