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Bombas

Posted by on 16/02/2015

[…] o motivo pelo qual o Estado não pode mais dar-se ao luxo de custear diplomas de graduação é que o número de pessoas com diploma de universidade aumentou de maneira tão astronômica. Isso por si só ajudará a acabar com a falsa mística da expressão “com diploma superior”. […] Ao invés de perguntar ‘Você frequentou a universidade?’, os empregadores perguntarão ‘Que universidade você frequentou?’

Trecho retirado do artigo “A Universidade está fora – Por que ser formado na universidade está prestes a perder seu prestígio”de autoria de Mark Mason, publicado na revista Spectator de 24 de janeiro

Gasto com FIES cresce 13 vezes e chega a R$ 13,4 bi, mas ritmo de matrículas cai

Manchete de artigo publicado no jornal O Estado de São Paulo de 15 de fevereiro sobre o financiamento às universidades privadas dado pelo programa de Financiamento Estudantil do governo federal

Os políticos estão lá para dar a impressão de que você tem liberdade de expressão. Você não tem. Você tem dono. Eles mandam em você.

George Carlin, humorista americano (1937-2008)

    Prezados leitores, neste feriado de Carnaval, resolvi fugir da folia e apreciar a natureza no SESC Interlagos, acompanhada de duas amigas. As quaresmeiras, primaveras e ipês estavam maravilhosamente floridos, mas o cheiro à beira da Represa Billings estava nauseabundo. Funcionários explicaram-nos que o olor desagradável é devido à proliferação de algas no verão, já que o esgoto é lançado sem tratamento em águas que poderiam estar agora aliviando o sofrimento dos paulistanos nessa época de escassez. Foi uma pena e uma surpresa para mim, que já havia estado no local antes e o único cheiro que sentira tinha sido o da vegetação.

    De qualquer forma pudemos conversar e reclamar da vida, cada qual a seu modo. Uma das minhas amigas é professora em uma universidade particular e diz que está insuportável continuar, porque metade do corpo docente foi mandado embora para cortar custos e os profissionais que ficaram terão que dar conta do dobro dos alunos em cursos presenciais e à distância. Corre o boato de que a universidade está para ser vendida, já que está hazendo uma consolidação no setor, e os donos estão cortando as despesas no afã de auferir lucros suficientes para aumentar a atratividade do negócio e por tabela o preço de venda. De fato, com base nos relatos da minha amiga sobre o modo como a organização é feita, a educação é um grande negócio, os professores e os alunos são os insumos que serão processados para gerar os números. Se nessa máquina de moer gente houver a aquisição de educação por parte do cliente será um mero acidente, cuja realização ou não não determina o sucesso ou o fracasso do empreendimento.

   Essa baixa qualidade é evidenciada, entre outros indicadores, pelos 16% de faculdades, centros universitários e universidades que têm índices de qualidade acima do mínimo exigido para participar do FIES. Mas não atingir o mínimo estipulado pelo MEC não significa uma sentença de morte, porque 10% das 448 instituições que receberam 80% de todo o valor gasto pelo governo com o programa não tinham conceito. Enfim, é um grande negócio para os capitalistas da educação, grupos como Anhanguera, UNIP, Estácio de Sá, Nove de Julho, para citar os maiores recipientes de verbas públicas. Essas universidades não correm risco de receber calote, pois o governo paga a mensalidade, e dão ao aluno um diploma de qualidade duvidosa, considerando o quanto sua obtenção é facilitada para que o aluno vá até o fim. Essas empresas muito espertamente têm transferido os estudantess que antes pagavam mensalidades por si próprios para o FIES de forma a garantir o fluxo de caixa. Tenho certeza que daqui a alguns anos, quando esses formandos perceberem que o canudo não lhes proporcionou a ascensão profissional que esperavam, haverá um calote geral nos pagamentos dos empréstimos ao governo federal. E claro, o prejuízo será arcado por toda a sociedade brasileira, para que uns poucos empresários ganhem muito dinheiro.

     Essa é apenas uma das bombas de efeito retardado que descobri no meu retiro carnavalesco. Outra má notícia que projeto para o futuro é o uso desenfreado que está sendo feito dos recursos do FGTS para a construção da infraestrutura da Copa do Mundo e das Olimpíadas do Rio. Isso não inclui somente as obras, mas a remoção de populações à bala dos locais, como ocorreu com a Aldeia Maracanã em março de 2013, nas proximidades do estádio. Alguns poderão acusar-me de vir com notícia velha, mas confesso que eu não sabia que havia uma aldeia indígena urbana no Rio de Janeiro. Fiquei sabendo disso por intermédio de um documentário a que assisti em algum canal obscuro da TV a cabo. Sâo notícias que não recebem a devida atenção da mídia, porque elas são importantes demais para serem debatidas. Afinal, se as televisões, jornais impressos e sites de notícia dessem ênfase à tragédia pessoal das pessoas que tiveram que ser retiradas de suas casas para dar lugar ao tal do legado da Copa e das Olimpíadas, nós, brasileiros que pagamos a conta, conscientizaríamo-nos de como o dinheiro está sendo gasto para encher o bolso das empreiteiras.

     Agora eu pergunto: será que o Conselho Curador do FGTS está acompanhando atentamente o destino do patrimônio dos trabalhadores? Ou está chancelando tudo, como fez o Conselho de Administração da Petrobrás a respeito da compra da refinaria de Pasadena? Meu fatalismo em relação aos empréstimos do FIES aplica-se aos recursos do fundo de garantia, e pressinto que nossas autoridades daqui a alguns anos cobrarão alguma taxa para cobrir o rombo, seja tornando o saque ainda mais difícil do que já é, seja corrigindo-o com índices que espelhem cada vez menos a perda monetária com a inflação.

     Prezados leitores, muitas bombas estão colocadas no nosso colo pelos nossos donos, como descreve precisa e sarcasticamente o humorista americano George Carlin que falava das mazelas dos Estados Unidos, mazelas essas que são similares àquelas enfrentadas aqui. Elegemos políticos que quando chegam ao poder têm sua própria pauta secreta, que não compartilham conosco quando pedem nosso voto. Por acaso nessa última eleição presidencial houve uma discussão transparente sobre o impacto nas contas públicas causado pelas benesses dadas a donos de universidades, empreiteiras, indústria automobilística com subsídios, isenções fiscais, facilidades de crédito? Lembro-me de Dona Dilma mostrando os números do PRONATEC, de incentivo ao ensino técnico, e do FIES, mas ela jamais falou sobre os casos de universidades que continuam recebendo dinheiro do governo, mesmo depois de o aluno ter abandonado o curso, ou que recebem dinheiro por alunos que teoricamente cursam Medicina, mas que na prática cursam pedagogia. E o senhor Aécio Neves também não perguntou sobre isso, talvez porque tenha recebido doações desses grandes grupos educacionais.

     E assim é a vida, nossos donos nos mandam segurar as bombas e nós as seguramos, torcendo para que a explosão não nos cause sérios danos…

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