A Tragédia ou Desastre de Bhopal foi um acidente industrial que ocorreu na madrugada de 3 de dezembro de 1984, em Bhopal, quando 40 toneladas de gases tóxicos vazaram na fábrica de pesticidas da empresa norte-americana Union Carbide. É considerado o pior desastre industrial ocorrido até hoje, quando mais de 500 mil pessoas, a sua maioria trabalhadores, foram expostas aos gases. O número total de mortes é controverso: houve num primeiro momento cerca de 3.000 mortes diretas, mas estima-se que outras 10 mil ocorreram devido a doenças relacionadas à inalação do gás.
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O caso Philip Morris x Uruguai teve início em 19 de fevereiro de 2010, quando a empresa multinacional de tabaco Philip Morris International protocolou uma reclamação contra o Uruguai. A empresa queixa-se de que a legislação de combate ao fumo do Uruguai desvaloriza duas marcas registradas da Philip Morris e seus investimentos no país, e está processando o Uruguai para obter uma indenização nos termos do tratado bilateral de investimento entre a Suíça e o Uruguai. (A Philip Morris é sediada em Lausanne). O tratado prevê que os litígios sejam resolvidos por arbitragem, sem possibilidade de recurso a outras instâncias, no Centro Internacional de Resolução de Controvérsias Relativas a Investimento (ICSID).
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Prezados leitores, nesta semana nós brasileiros recebemos mais um notícia que, de acordo com nossa imprensa, nos mostra que estamos no caminho errado. O Acordo de Livre Comércio do Pacífico (TPP em inglês) entre Estados Unidos e outros 10 países da costa do Pacífico ficou pronto e o Brasil está fora. De acordo com uma pesquisa do economista Lucas Ferraz, da Fundação Getúlio Vargas, citado por Veja em sua edição de 14 de outubro, “haverá uma retração de 2,9% nas exportações de industrializados e de 5% nas de produtos de agronegócios brasileiros”.
Considerando o quão vulneráveis estamos neste momento, com uma queda prevista no PIB de 3% em 2015 e de 1,5% em 2016, não há dúvida de que a perda de mercados é algo a se lamentar. Além do mais, observa-se uma diminuição crescente da taxa de poupança do Brasil, que era de 18,1% do PIB em 2012, passou para 17,6% em 2013 e ficou em 16,2% do PIB em 2014. Hoje em dia, estar fora do que os economistas chamam de cadeias globais de valor, estabelecidas juridicamente pormeio de tratados internacionais de comércio, significa estar fora da rota de investimentos, tão necessários para um país como o Brasil que pouco economiza.
E, no entanto, permitam-me enfocar o lado negro desses acordos, o aspecto negativo pouco explorado na imprensa, que é o imenso poder que as multinacionais ganham na arena global de proteger seus interesses. Para explicar melhor vou valer-me de um conceito jurídico. Qualquer Estado soberano tradicionalmente goza de uma prerrogativa, que é a de poder praticar atos de império, que são atos impostos unilateral e coercitivamente ao particular independentemente de autorização judicial. Um exemplo desse tipo de atuação é a encampação de um serviço prestado por uma empresa particular. O Estado arroga-se a si próprio o direito de retomar o serviço quando julgar que a empresa não está atuando da maneira mais benéfica para o interesse público. Evo Morales, o presidente da Bolívia, fez uso desse poder de império quando em 2006 decidiu nacionalizar o setor de hidrocarbonetos do país, o que levou à expropriação das refinarias de propriedade da Petrobras. Lula, num gesto de boa vontade diplomática de respeito à soberania da Bolívia, decidiu deixar para lá e a Petrobrás não levou o caso à justiça, o que poderia ter feito.
Acordos comerciais internacionais como a TPP eliminam essas surpresas desagradáveis porqu eo poder de império do Estado, atributo da sua soberania, fica bastante limitado. Uma empresa que se sente lesada por medidas tomadas por um determinado Estado signatário de um tal tratado pode brigar em pé de igualdade recorrendo à arbitragem internacional, sem necessidade de abrir processo no país cujo governo está lhe fazendo maldades. A decisão dos árbitros é final, irrecorrível e ao Estado que quis colocar as asinhas de fora só resta acatar e cumpri-la sob pena de sofrer sanções. O caso citado acima envolvendo a Philip Morris e o Uruguai, ainda não solucionado, é emblemático dessa nova correlação de forças no cenário global. As políticas de saúde pública do país platino para coibir o fumo estão sendo colocadas em xeque por uma empresa que vende cigarros e que portanto perderá receitas se elas forem bem-sucedidas. Se o Uruguai acabar sendo condenado a pagar indenizaçâo à Philip Morris, isos pode tornar a proteção da saúde dos uruguaios muito cara ao ponto de inviabilizá-la com os recursos orçamentáriosd de que o país dispõe, a depender do montante estipulado pelo ICSID.
Não é de estranhar-se que os Estados Unidos sejam os principais promotores da TPP, pois o país têm o maior estoque de investimentos diretos estrangeiros no exterior, cinco trilhões e duzentos e sessenta bilhões de dólares em 2014. A proteção dos investimentos oferecida pela TPP inclui uma série de medidas que diminuem a margem de manobra dos Estados nacionais que pretendam realizar alguma política industrial: proibição de favorecimento de empresas estatais, proibição de certos subsídios. Os países em desenvolvimento que aderiram à TPP, entre eles o Chile, o Vietnã e o Peru, não poderão tentar executar o modelo de chinês de industrialização baseado na cópia barata dos produtos criados pelas multinacionais. A TPP criminaliza o roubo de segredos industriais e estabelece uma robusta proteção às patentes.Para ficarmos no nosso contexto sul-americano, essa rigidez não faz muita diferença para Chile e Peru que sempre forma exportadores de commodities e nunca tiveram grandres pretensões à industrialização. Mas para um país mais complexo como o Brasil com um parque industrial diversificado, a opção por aderir a regras que defendem primordialmente os interesses das empresas multinacionais donas dos capitais e das patentes não é uma escolha tão óbvia.
No final das contas tudo é uma questão de ponderação: abdicarmos da autonomia de o Estado formular e executar política industrial, social, ambiental para que possamos fazer parte do clube fará com que os investimentos estrangeiros aumentem exponencialmente no Brasil? Ou tais investimentos dependem muito mais da capacidade que o Estado possui de criar um ambiente favorável aos negócios proporcionando a infraestrutura material e não material adequada? Será que diminuir ainda mais a margem de manobra do governo vai permitir que o Brasil crie essa infraestrutura? Ou será que o medo de violar tratados internacionais fará com que os nosos governantes tornem-se ainda mais tímidos nas suas ambições de política?
Prezados leitores, é verdade que o sonho de todo brasileiro é trabalhar em uma multinacional. Mas o que é bom para elas não necessariamente é bom para nós, habitantes de países em desenvolvimento. A Union Carbide nunca foi realmente punida pelo acidente de Bhopal. O julgamento ocorrido nos Estados Unidos chegou ao veredicto de que a culpa foi de uma sabotagem de um funcionário e em termos de indenização custou à empresa apenas 0,48 dólares por ação. Talvez estejamos fazendo uma grande besteira em não termos participado da TPP, mas participar dela com certeza nos traria custos. Como era de se esperar, o modo como a questão é posta na imprensa brasileira é mais uma vez no modo Fla x Flu: a TPP é boa, o PT que a esnobou pé mau. Ponto final. Infelizmente a realidade, como a Union Carbide e a Philip Morris nos mostram, é mais complexa.