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Impressoes de uma turista

Posted by on 29/11/2012

      Há três semanas comuniquei aos leitores do Montblatt que eu iria viajar à Grécia e nosso editor prometeu que eu iria manifestar minhas impressões sobre o país quando voltasse. Para falar a verdade fiquei um pouco angustiada com esse anúncio, porque iria ficar no país somente sete dias, o que é insuficiente para ter noção de como as pessosas de fato vivem. E o turista, por razões óbvias, tem contato sempre com o lado bom das coisas, com as lindezas do lugar, porque seu objetivo não é fazer um estudo antropológico de campo, mas divertir-se, descansar e fazer seu dinheiro ter sido bem gasto, sem que qualquer incompetência ou desastre natural atrapalhe sue investimento.

       Feitas essas ressalvas, para aqueles de nossos leitores que nunca foram à Grécia, o cálculo do custo e do benefício é amplamente favorável. Para os glutões comer lá é muito barato e bom. Eu não cheguei a frequentar restaurantes porque queria economizar a todo custo, mas as lanchonetes, bares e cafés oferecem saladas frias e sanduíches regados a muito pimentão, pepino,  azeitonas, azeite de olíva, manjericão e todos aqueles ingredientes da tal cozinha mediterrânea que dizem os doutores é a que garante a longevidade, livre dos anti-oxidantes cancerígenos. E sabe a que preço? Com quatro euros e meio, um pouco mais de 10 reais eu comia para bater perna pela cidade. Definitivamente Rio de Janeiro e São Paulo não ficam nada a dever aos europeus em matéria de custo de vida, apesar de ainda faltar um bocado para que nós possamos usufruir dos salários e dos benefícios sociais de que eles, por enquanto, desfrutam.

        Para aqueles que estão atrás de cultura Atenas também tem muito a oferecer a bons preços. Não falo nem do Parthenon, para falar a verdade foi um local que não me impressionou lá muito, ou melhor, obtive menos do que eu esperava. As construções estão muito mutiladas, após séculos de depredações e destruição, para que possamos apreciar a beleza do templo que abrigava a estátua da deusa Athena. Turcos, católicos fanáticos, imperialistas ocidentais, todos literalmente tiraram uma lasca do Parthenon e hoje, em que pese estar sendo restaurado, não dá uma pálida idéia do que foi nos tempos áureos de Péricles.

       Para termos idéia do que foi a Grécia de antanho é preciso ir aos museus, onde os gregos guardam aquilo que permaneceu no país. Falarei apenas de dois. Em primeiro lugar o Museu Arqueológico Nacional, fundado sob o patrocínio de um mecenas exilado, Demetrios Bernardakis, que nos anos 1950 e 1960 adquiriu suas feições atuais, após ter escapado por poucode ter a coleção dilapidada na Segunda Guerra Mundial. Esculturas, monumentos funerários, vasos, ânforas nos permitem vislumbrar um dos períodos mais férteis da história humana que deve com certeza encher de orgulho os herdeiros da cultura grega, entre os quais os ocidentais que reivindicam para si tal patrimônio espiritual. Eu fiquei quatro horas andando pelos imensos corredores, e tive a sorte de não encontrar muitos turistas em meu caminho, o que me permitiu apreciar ainda mais tudo o que eu vi. Não é à toa que esse museu é considerado um dos 100 lugares que você deve visitar antes de morrer. Como diria Camões, cessa tudo quanto a antiga musa canta que um valor mais alto se alevanta. Depois de ver todas aquela figuras orgulhosas, altaneiras, ou plácidas e tranquilas a depender se estavam no auge da vida ou de cara com a morte, ficamos um pouco enfastiados com a arte moderna. O preço pago é de seis euros, equivalente ao que se paga para ir ao MASP, em São Paulo, cuja coleção em exibição, ao menos em termos numéricos, não faz sombra ao que é mostrado no museu grego.

       Para não aborrecer os leitores, mencionarei somente o Museu da Acrópole que fica em frente ao local epônimo e custa o mesmo preço que o National Archeological Museum. Não o abordo por ter uma coleção estupenda, pelo contrário, tudo o que contém lá poderia muito bem ser exibido  em uma ala do outro,  mas o objetivo da moderna construção, financiada pela União Européia e com toda a parafernália de segurança e conservação mais atualizada, parece ter sido o de mostraro quão a Grécia faz parte da Europa  por ter sido o berço da cultura ocidental. Fins mais ideológicos do que museológicos, uma fortuna gasta para convencer as pessoas do sonho da Europa unida. Há um vídeo sobre o que era o Parthenon nos tempos pagãos e algumas peças de grande importância para justificar um museu de última geração com uma coleção tão pequena: as assombrosas cariátides retiradas da Acrópole e frisos do Parthenon em processo de restauração. Por mais que saibamos que tudo aquilo fez a alegria dos empreiteiros, não se pode deixar de admirar aquelas formas humanas e animais de tanta plasticidade e movimento. Aqueles homens sentados em seus cavalos em plena refrega são muito mais sexy do que qualquer modelo pegador do Big Brother. É realmente um privilégio poder ter contato com o que o hommo sapiens pode fazer de melhor e que nos aproxima das estrelas.

         A esta altura devo dizer que a turista deslumbrada com o que via também teve contato com o lado digamos não clássico da Grécia, fruto dos desacertos dos últimos anos. Vi demonstrações na Praça Sintagma, sede do Parlamento, vi muitas lojas e estabelecimentos fechados, e em um dos meus dias de estada lá o metrô parou às cinco horas em greve, o que abreviou meus passeios. E na volta ao Brasil tive a desagradável surpresa de receber um e-mail da dona do apartamento em que fiquei acusando-me de ter roubado duas xícaras e pedindo indenização mais alta do que o que eu pagara pelo apartamento. Felizmente, a agência da internet que mediou as relações entre mim e Konstantina aceitou meus argumentos e acabei só pagando por um café derrubado no tapete, sobre cuja limpeza eu já tinha me comprometido com a dona ao vivo. Enfim, pode ser desespero em face da situação econômica, esperteza, sei lá. Mas fiquei um irritada por ter sido acusada de ser ladra. Espero que os gregos em geral não sejam como minha “senhoria”.

         Minha impressão geral é que a Grécia é um país como o Peru: herdeiro de um passado maravilhoso e que não conseguiu fazer nada que contribuísse a essa herança. O jeito é eles se contentarem em ser um parque temático para apreciadores de arte, amantes de belezas naturais e da boa comida.Que os deuses protejam a Grécia dos comissários europeus e da Angela Merkel, que querem fazer uma interferência branca no país, leiloar seus bens públicos e confiscar suas receitas na fonte, independentemente do que isso custará à população. Na próxima semana, se eu estiver inspirada, contarei a segunda parte da minha viagem às “Europas”.

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